HABITAÇÃO SOLIDÁRIA É UM PROJETO DA FUNDAÇÃO MÃO AMIGA

42 jovens voluntários recuperam oito habitações em Sever do Vouga

Habitação Solidária é um projeto que promoveu a recuperação de oito casas de famílias carenciadas, levada a efeito por 42 jovens universitários voluntários, no prazo de 11 dias, em Sever do Vouga. A missão foi totalmente cumprida e, assim, com a ajuda de uma (Fundação) Mão Amiga oito famílias passam a ter uma habitação com (mais) dignidade, afinal um direito de todos os cidadãos.
“Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar”, determina a Constituição da República Portuguesa, no nº 1 do seu artigo 65º, dedicado à habitação e urbanismo.
Ora, como toda a gente sabe, nem sempre é assim. E, apesar da mesma Carta Magna plasmar uma série de obrigações para o Estado no sentido de que aquele nº 1 do artigo 65º se cumpra, são evidentes em todas as regiões do país situações não conformes ao que refere a lei.
Ora, quando o Estado não consegue fazer, mas a necessidade das pessoas exige uma intervenção, a sociedade civil portuguesa tem, ao longo da história, sabido dar resposta, valendo aos desvalidos e fazendo aquilo que, muitas vezes, compete ao Estado.
Bem, mas contextualizemos a situação.
Sever do Vouga, vila do distrito de Aveiro, tem, segundo o Censos 2011, menos de 12.500 habitantes e é conhecida como a «Capital do Mirtilo». Faz fronteira com o distrito de Viseu, através do concelho de Oliveira de Frades, e é um dos territórios mais interiores do distrito de Aveiro. Banhada pelo rio Vouga, a vila é um aglomerado urbano pitoresco, mas que na ruralidade envolvente esconde algumas bolsas de pobreza.
Fundação de Edite Costa Matos, Mão Amiga, criada, em Sever do Vouga, em 2009, com o propósito de “estar mais próximo da comunidade, alargar intervenções, aumentar a rede de voluntariado” e “aproximar a comunidade à realidade de todos os dias”, com o fito no “empreendedorismo”, em “fomentar a solidariedade”, em “criar redes formais e informais”, em “conhecer as reais necessidades e lacunas que vão existindo na comunidade”.
É neste âmbito que nasce o projeto Habitação Solidária, um dos vários da Fundação Mão Amiga, que este verão levou 42 universitários voluntários até Sever do Vouga para recuperarem oito habitações de pessoas com evidentes carências.
“Habitação Solidária é projeto de desenvolvimento comunitário, que, aliando a mudança gerada na reabilitação habitacional, procura promover todo o tipo de competências nos indivíduos/agregados familiares beneficiários dessa intervenção, contando, para isso, com a envolvência e parceria da comunidade, nomeadamente IPSS, associações locais, juntas de Freguesia, empresas e particulares”, pode ler-se no site da Mão Amiga, onde é ainda acrescentado: “Esta reabilitação tem por objetivo reconstruir, adaptar ou fazer melhoria de espaço(s), trabalhando, simultaneamente com os agregados familiares beneficiários”.
Ou seja, não há uma intervenção meramente física no edificado, o projeto envolve igualmente o agregado familiar e algum acompanhamento social.
Assim, de 18 a 29 de julho, 42 universitários voluntários, sob orientação de mestres de obra experimentados, recuperaram oito habitações, três na localidade de Silva Escura, outras três em Rocas do Vouga e uma ainda na vila de Sever do Vouga.
Madalena Machado, 73 anos de idade, enviuvou aos 40 e criou quatro filhos no lugar de Irijó. Com um filho emigrado em França, outro a viver no Porto e mais dois nas proximidades, Madalena Machado ansiava há muito por ter “uma casinha em condições” e, por isso, considera a iniciativa da Mão Amiga como “uma ideia muito boa”.
“Isto estava uma miséria, mas eu não tenho possibilidades de arranjar”, lamenta.
Enquanto conversa com o SOLIDARIEDADE, duas voluntárias pintam as paredes e muros exteriores, ao passo que os outros três rapazes, juntamente com o mestre de obras, tratam de colocar um chão novo na habitação. O antigo estava de tal forma degradado e a madeira apodrecida, que a única solução foi deitar tudo abaixo e reconstruir de novo.
José Maria Magalhães, licenciado em Desporto, pelo ISMAI (Maia), e mestrando em Gestão Desportiva, na mesma instituição de ensino, é o responsável pela obra na casa de Madalena Machado.
Aos 25 anos, o ainda estudante é repetente na iniciativa.
“O que me move é ajudar as pessoas, como também já ajudei alguns sem-abrigo, apesar de nunca ter sido muito dado ao voluntariado”, refere, acrescentando: “Sempre gostei de construir coisas com as mãos e, agora, numa dimensão maior deu-me muito prazer”.
José Maria sublinha que “é uma experiência gira”, ainda para mais “a obra está a andar bem”, afirma satisfeito.
Aos potenciais candidatos a fazer voluntariado nesta área, o mestrando do Porto deixa uma mensagem: “Experimentem, porque depois de fazerem algo como isto darão mais valor a pequenas coisas”.
A cerca de três, quatro quilómetros, em Silva Escura, um outro grupo de voluntários dá alguma dignidade à habitação de Isabel Marques, de 56 anos.
Apesar da exígua casa ir ficar “ainda mais pequena”, a boa-nova é que, finalmente, Isabel e o marido vão ter uma casa de banho no interior da habitação. Já não será mais preciso ir ao anexo que o filho lhes construiu no seu terreno para os pais se servirem.
“Claro que agora está mais agradável, pois isto estava tudo deteriorado. Já tinha pedido à Câmara ajuda para reparar o telhado, mas mandaram-me pedir um empréstimo”, lamenta, dizendo de sorriso aberto na cara: “Estou satisfeitíssima e já chorei muitas vezes de alegria”.
Sobre a rapaziada que lhe compôs a casa, “são cinco estrelas e muito trabalhadores”, deixando ainda um recado: “Aqui na aldeia temos muita juventude, mas não querem fazer nada!”.
Beatriz Magalhães, de 23 anos, é estudante de nutrição na Universidade do Porto e estas experiências não lhe são desconhecidas.
“Eu sou católica e há muito que participo em campos de férias como animadora”, começa por dizer, explicando como foi parar a Sever do Vouga em pleno julho para trabalhar na construção civil: “Com um grupo de amigos já pertencia à Just a Change e comecei a ver o impacto que as ações tinham em Lisboa e no Porto, as realidades que conhecia. Portanto, vir para aqui foi muito natural”.
Para Beatriz, “não é por menos 15 dias de praia que se perde o verão e, depois, é para um bem melhor”, rematando: “Não penso que fosse melhor estar na praia!”.
Àqueles que nunca experimentaram o voluntariado social, a estudante de Nutrição diz que “ver a reação dos beneficiários é a melhor recompensa”, revelando algo que demonstra a cumplicidade que se estabelece entre voluntários e beneficiários: “Conseguimos trabalhar mais cinco horas num dia porque a dona Isabel encheu-nos o coração e motivou-nos muito com a sua alegria de ver como estava a ficar a sua casa”.
Por outro lado, a futura nutricionista confessa que “é uma experiência um bocado dura, mas com a ajuda do mestre de obras e a vontade de aprender” dos voluntários, é fácil sentir-se “confortável com o trabalho”.
“Recebemos muito mais do que damos e quando acaba queremos mais”, afirma Beatriz Magalhães, deixando um apelo: “Temos que aproveitar a idade que temos para enchermos o coração”.
O mestre de obras encarregue da casa de Isabel Marques foi José Coutinho, de 50 anos, natural de Sever do Vouga.
Quando os visitámos era um profissional satisfeito, até porque os prazos estavam todos cumpridos e a obra ia ficar pronta na data determinada.
“A grande satisfação de participar neste projeto é ajudar as pessoas mais carenciadas para que tenham melhores condições”, realça, dizendo-se desde já “disponível para novos desafios do género”.
Sobre os voluntários, um elogio: “É malta muito empenhada e, embora não tenham muito conhecimento, são interessados e querem aprender”.
Em 11 dias, com o trabalho dos voluntários, «angariados» pela Associação Just a Change e a Universidade de Aveiro, e o apoio logístico da Câmara Municipal de Sever do Vouga, oito pessoas/agregados familiares passaram a ter melhores condições de habitabilidade, o que, certamente, é razão para encararem o futuro com um sorriso mais pronunciado no rosto.
E, para tal, bastou uma… Mão Amiga.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)

 

Data de introdução: 2018-08-09



















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