EDITORIAL

A Solidariedade em Festa

1. Na “rentrée”, que, em tempos recentes, era partidária e agora se tornou solidária, aí está a segunda Festa da Solidariedade. É uma emblemática iniciativa da CNIS.
Bem no coração do Minho, na cidade de Barcelos, será o seu último palco de um fim que merece ser festivo.
Último mas não exclusivo: anteriormente e ao longo de vários dias, já a marcha da “Chama da Solidariedade” é acontecimento em crescendo que, às marés e aos ventos, anuncia o envolvimento na causa da solidariedade social de muitas e muitos, por todo este nosso país.
Com a habilidade e a dedicação de uma belíssima equipa, liderada por Eleutério Alves, para a Festa da Solidariedade deste ano foram centralizados muitos e preciosíssimos contributos.
À frente, no tempo e na actividade, naturalmente, a equipa dinamizadora da Chama. Logo a seguir a União Distrital de Braga – e como se envolveu ela! Depois a Câmara Municipal de Barcelos e quase todas as Uniões por cujos distritos percorreu a Chama (Lisboa, Santarém, Leiria, Porto e Braga). Que belo e persistente trabalho vêm desenvolvendo! E esse é um exemplo de muitos envolvimentos: Governos Civis, Câmaras Municipais, Paróquias, Juntas de Freguesia, Forças de Segurança, meios de comunicação social e muita, muita gente, anónima e confiante.
À frente de todos, por trás de todos, ao lado de todos e de mãos dadas com todos, as IPSS - Instituições Particulares de Solidariedade Social: com os seus muitos dirigentes, muitos colaboradores, muitos utentes e alguns voluntários que, ontem e hoje, amanhã e sempre, fazem da acção de solidariedade social a bela expressão de cidadania e de união de simpatias, interesses e propósitos, com a sublime arte do coração e da razão. O seu envolvimento começou quando o seu olhar se fixou na percepção dos problemas de cidadãos, próximos e distantes, com a implicação de uma presença física, uma força moral, o apoio do ombro amigo e uma mobilização para situar problemas numa perspectiva orientada para encontrar soluções.

2. As nuvens que se adensavam na primeira festa da solidariedade e a chuva que impiedosamente caiu e provocou o seu precipitado fim eram um espelho fiel em que então os dirigentes solidários viam projectada a imagem da solidariedade social que devotadamente tinham abraçado.
Depois de claros sinais de municipalização da solidariedade, com passos dados em falso e negociações revestidas pelo manto do sigilo, emergiam tentações da sua nacionalização por um Estado que parecia ignorar experiências, dimensões e envolvimentos. Já sobejamente constrangidos com inúmeras dificuldades, os dirigentes solidários deparavam-se com mais algumas frentes para adensar as suas já grandes incertezas. Não eram infundados os seus receios. Então, o “palco envolvente” da “rentrée” estava carregado de tons marcadamente cinzentos…
O ano não foi nada fácil. No seu desenvolvimento, quantas as dúvidas e quantas as tentações de um resvalar para a rampa do desânimo!
A experiência baseou o pensamento. O pensamento deu dimensão à voz. A voz gerou sensatez.
Se o caminho percorrido nem sempre foi rectilíneo e se nem tudo está satisfatoriamente resolvido, porém, há razões para afirmar que o ambiente se tornou bem mais claro e a esperança eficazmente foi recomposta.
Sobram razões para fazer festa: somos muitos, temos visibilidade; somos reconhecidos, temos consistência; somos generosos, temos abrangência; somos determinados, a solidariedade social tem futuro.

3. A Festa da Solidariedade pretende ser uma montra de vitalidade.
Também pode e deve ser o momento para afirmação de valores como o da própria solidariedade, enquanto prática da cultura de aceitação mútua, de acompanhamento, de apoio, de integração, de partilha, de presença, de protecção e de solicitude.
Nem essas práticas, nem os valores que a elas subjazem surgem naturalmente no desenvolvimento do ser humano. A solidariedade não é espontânea: é uma conquista contra o egocentrismo e o egoísmo, que caracterizam a criança pequena, como também contra o etnocentrismo de todo o grupo humano e a prioridade que dá aos seus próprios interesses.
A solidariedade é, também, uma construção social e cultural, uma conquista frágil da civilização, sem a qual não há futuro para a humanidade.
Para que ela se desenvolva na sociedade, pelo menos duas condições devem ser permanentemente satisfeitas:
- O princípio de solidariedade deve fazer parte das ideias e dos valores centrais da maior parte dos indivíduos e dos responsáveis pelo viver em comum: importa acreditar firmemente nele, incorporar nele uma parte da própria identidade e da sua auto-estima.
- Não há futuro para a solidariedade sem uma forma de reciprocidade, pelo menos a meio-termo: a maior parte dos seres humanos comuns não pode ser permanentemente solidária em sentido único. No mínimo, a reciprocidade do conhecimento e do reconhecimento.
A Festa da Solidariedade é uma oportunidade para o celebrar e afirmar. Com esperança…

 

Data de introdução: 2008-09-08



















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