Como iguais ou com diferentes?

1. Visando a reorientação das escolas especiais para Centros de Recurso para a Inclusão (CRI), no passado dia 14 de Fevereiro foi assinado um protocolo entre o Ministério da Educação e seis organizações representativas de Instituições de apoio a pessoas com deficiência. A Humanitas (Federação Portuguesa para a Deficiência Mental), filiada na CNIS, é uma das subscritoras e aparece ao lado de Confederação para a Deficiência Mental (Codem), Federação das Associações de Paralisia Cerebral, Federação Nacional de Cooperativas de Solidariedade Social (Fenacerci), Federação Portuguesa de Autismo e União dos Centros de Recuperação Infantil do Distrito de Santarém (Unicrisano).
Tendo como horizonte temporal o Quadro de Referência Estratégico Nacional, aí se define como objectivo geral dos CRI apoiar a inclusão no ensino regular das crianças e jovens com deficiências e incapacidade, através da facilitação do acesso ao ensino, à formação, ao trabalho, ao lazer, à participação social e à vida autónoma, promovendo o máximo potencial de cada indivíduo, em parceria com as estruturas da comunidade.
Ainda, segundo o referido Protocolo, os Centros de Recurso funcionam como serviços da comunidade, para a comunidade e com a comunidade e como estrutura de suporte ao sucesso escolar dos alunos com deficiência ou incapacidade. Acompanharão os agrupamentos escolares para que estejam dotados de meios e recursos que permitam corresponder ao objectivo de Escola para Todos e, conjuntamente com as Instituições, suprirão eventuais dificuldades.

2. Anteriormente, muitas crianças com deficiência eram mantidas em casa sem qualquer tipo de apoio, entregues apenas aos precários cuidados das famílias. Então, muitas deles eram coagidas a crescer ou vegetar separadas do mundo que ostensivamente as ignorava ou eram enclausuradas num triste e lúgubre espaço que chegavam a partilhar com inumanos.
No princípio dos anos 60, foi o sector solidário que deu os primeiros passos no processo hoje conhecido como de Inclusão.
Começaram por ser as associações de pais, a que se juntaram as cooperativas depois do 25 de Abril.
Presentemente, distribuídas por 327 equipamentos com 832 valências de intervenção precoce, lar de apoio, regime ambulatório e centros de férias, há no país cerca de 16.000 pessoas com deficiência apoiadas pelas instituições. Foram criadas ou porque o coração o exigia ou porque a vizinhança o pedia. E são essas instituições conhecidas com designações que vão desde as associações de pais e amigos dos cidadãos com deficiência mental, às associações de autistas ou de paralisia cerebral, centros de recuperação infantil, cooperativas de solidariedade social ou movimentos de apoio a cidadãos diminuídos. A maior parte são instituições que surgiram depois de 1974 e todas elas contribuíram para que as pessoas com deficiência tivessem mais razões para viver, melhor qualidade de vida e mais esperança em viver por mais tempo. Quantas pessoas aí encontraram os espaços e os afectos de que careciam e que anteriormente lhes eram negados!
Sozinhas, numa fase inicial, depois apoiadas pela Segurança Social, essas instituições construíram um referencial de apoio que veio a designar-se “apoio sócio-educativo”. Este modelo financiou por muitos anos o enquadramento destas crianças e jovens num sistema paralelo (Segurança Social para as IPSS e Ministério da Educação para as Cooperativas).
O percurso efectuado ao longo dos anos pelas Instituições e as muitas experiências realizadas fizeram optar pela colocação e acompanhamento destas crianças e jovens em salas de aula em parceria com as escolas. O caminho percorrido, a par do movimento Europeu, que teve o seu momento decisivo com a Declaração de Salamanca, aprofundou a certeza de que todas estas crianças e jovens têm direito à educação e devem, sempre que possível, ser integradas no sistema de ensino regular sendo assim assumidas definitivamente pelo Ministério da Educação.
Este princípio aceite por todos, tem tido diferentes interpretações que assentam em diferentes avaliações, mas com todas a implicarem a capacidade das Escolas se adaptarem para receber convenientemente estes casos, assumindo-se como Escola Para Todos.

3. Perto de um quinto dos utentes das Instituições para as pessoas com deficiência serão atingidos pelo referido Protocolo.
Para bem ou para mal? Deles ou das outras crianças?
É conjecturável que a não inclusão destas crianças na escola regular possibilitará um nicho de mercado não despiciendo. Mas as dúvidas sobre a maior ou menor bondade de uma “escola para todos” são legítimas e distribuir-se-ão equitativamente entre os que optarão por uma ou outra conclusão. Uns sentenciarão que não será louvável tratar de um modo igual aquilo que é diferente e, num certo dogmatismo fundamentalista, poderão rotular de economicista ou perverso o ideal da “escola para todos”. Outros contraporão que, serem tratados de um modo totalmente diferente em espaços exclusivamente diferentes, provavelmente acentuará as diferenças de quantos já são diferentes. E assim mais excluídos se tornarão. E mais distantes ficarão os mais afortunados que não deixaram de ser irmãos e consortes daqueles a quem a vida menos fortuna deu.
Provavelmente mais ajustado será tratar todos com a possível individualidade, diferentemente, em “escolas para todos”. Sairão prejudicados os mais afortunados?
Desde que os menos afortunados sejam os mais “preferenciados”...
Atentas, experimentadas e como sempre interventoras na defesa dos interesses das crianças e jovens que há décadas apoiam e enquadram numa intervenção qualificada e por todos reconhecida, as organizações subscritoras do Protocolo que integram os Centros de Recurso para a Inclusão tudo farão para minimizar eventuais efeitos negativos resultantes do impacto criado por esta medida.
A Humanitas é a nossa esperança!...

* Presidente da CNIS

 

Data de introdução: 2008-03-06



















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