Para envelhecer com um sorriso de sonho

1. Pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social foi anunciada em Bragança uma medida de apoio à fixação dos idosos nas respectivas residências. Essa iniciativa prevê apoios à recuperação da própria morada para favorecer a auto estima e o gosto pela permanência na casa onde sempre se tinha vivido. Contando essa iniciativa com o envolvimento das autarquias e com a inestimável capacidade das Instituições de Solidariedade, alguns idosos poderão passar com agrado os seus dias nos espaços que ergueram, que à sua maneira modelaram e a que afectivamente se devotaram.
É uma medida com inegável alcance.

Muitos outros serviços são prestados pelas Instituições de Solidariedade a idosos: apoios domiciliários, centros de convívio, de dia e de noite, lares... E estes apoios são expressão de inestimáveis dedicações e, na globalidade, são desenvolvidos com acordos, insuficientes, com a Segurança Social. Assim se vai favorecendo a qualidade de vida de uma população tendencialmente mais numerosa: no país, hoje já são cerca de 165.000 os idosos apoiados pela iniciativa solidária (50.000 em centros de dia, 30.000 em centros de convívio, 40.000 em apoio domiciliário e 45.000 em lares de idosos).
Reparando nos números, na realidade e nas tendências, uma conclusão, entretanto, parece inultrapassável: para um número crescentemente maior, o lar de idosos será a sua última casa e durante um tempo mais alongado.


2. É edificante o enlevo e o rejuvenescimento dos avós que vêem nascer e crescer um neto: repentinamente as suas experiências são potencializadas, os seus afectos renascidos, os seus espaços redimensionados, os seus projectos de vida retomados e os seus sonhos alimentados com novos cambiantes e novos desafios. Tudo fica truncado quando esses idosos, posteriormente, se vêem coagidos a procurar um novo lar que lhes é absolutamente estranho e que, enquanto casa de idosos, é permanente evocação da sua decrepitude. È a frustração de quem muito deu e por troca recebeu a “carta de despedimento” porque já não fazia falta, foi “descartado” e não mereceu ser “reciclado”. Doravante, para esses idosos não sobra mais tempo para o rejuvenescimento, para o sonho ou para o gosto de viver.
Dizem alguns estudos que os residentes em lares de idosos são mais propensos para a tristeza, para o desânimo, para o desinteresse pela vida ou para o conflito. É o drama de quem sente a dureza da solidão num turbilhão de “muita” gente. E alguns, em alguma vez, já pensaram que melhor seria a sua sorte se mais breves fossem os seus dias.

Nesses estudos, com conclusões nem sempre ajustadas e numa leitura apressada, conclui-se que os lares são um mal, quando, efectivamente, mal será fazer dos lares a solução para fugir a soluções que, por acomodação, não se quer procurar. Eles são um serviço quando outros serviços não são possíveis ou as circunstâncias os aconselham.
Ninguém ousa duvidar: o ideal seria que os idosos pudessem manter-se com gosto naquilo que com gosto ergueram: na casa que edificaram, com a companhia daqueles que geraram, saboreando os afectos a que se devotaram, saboreando os frutos das causas a que se dedicaram, calcorreando os caminhos que abriram, alimentando as relações que desenvolveram.


3. Não vão longe os tempos em que se dizia que com um velho que morria era uma biblioteca que ardia. Ter um idoso em casa era uma preciosidade. Era o apreço pelos idosos, pelas suas experiências, pela sua serenidade, pela inestimável capacidade de transmitir valores que constituíam o fabuloso património imaterial de uma comunidade.

Alguns poderão pensar que esses eram os idos tempos da sociedade patriarcal e que os tempos de hoje são tempos de desenfreada correria e de implacável concorrência. É evidente que os tempos avançam e não recuam e a realidade de hoje não é a realidade de ontem.
Mas contribuir para que todos aqueles que vivem possam usufruir e apreciar o maior dom que é a vida, favorecer condições para que todos os viventes sorriam na vida e para a vida, é um desafio que quem cultiva a solidariedade de modo algum enjeita. Em última análise, esse é, aliás, o seu verdadeiro móbil.
E enquanto há tempo para o sonho, para a fruição e para a partilha é bom, agradável e salutar viver. E por isso, é tarefa de todos fazer da vida o gosto de viver.
Algumas experiências vêm sendo desenvolvidas.

E uma boa proposta a aprofundar poderá ser a de mobilizar voluntários, também jovens, que dêem tempo aos idosos. Nas suas casas ou nos centros e lares. É importante a dádiva de tempo para fazer companhia: não são raros os carecidos de quem seja eco da sua voz.

E um idoso é um inesgotável manancial de experiência, de conhecimento, de sensatez, de uma certa filosofia de vida. Por que não lançar ou desenvolver programas que favoreçam a iniciação na informática dos idosos? Para que eles possam perpetuar de uma forma ágil os conhecimentos adquiridos, as experiências vividas, os pensamentos alimentados. E para que possam entrar neste fabuloso mundo da comunicação: com outros idosos, com outras instituições, com o mundo que também é seu e que ajudaram a construir. A dádiva de tempo, também dos jovens, aliada a programas elaborados e apoiados poderia fazer verdadeiros milagres.
Os idosos sentiriam vontade de desafiar os dias para os viver e todos lucrariam com tanto saber e experiência acumulados.

Os dirigentes solidários sonham, os técnicos querem, o engenho e a arte de todos, também dos idosos, farão nascer realidades auspiciosas.

*Presidente da CNIS

 

Data de introdução: 2008-02-07



















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