EUGÉNIO FONSECA

As IPSS têm que ser espaços de inclusão

A identidade das nossas Instituições de Solidariedade Social fica posta em causa se, por qualquer razão, fizerem aceção de pessoas. A matriz solidária obriga sempre que se tiver de fazer uma opção, a escolha seja a favor dos mais desfavorecidos da sociedade. Sei, e lamento, que o Estado não acompanhe esta diferenciação, comparticipando com maiores valores os que têm menos comparticipações familiares ou, como acontece muitas vezes, não terem nenhuma. Compreendo os dirigentes que, verdadeiramente, querem colocar, acima de tudo, a proteção dos mais desfavorecidos, mas ao levar à prática esta prioridade põem em risco a sustentabilidade financeira das suas instituições.

Este é o mote para voltar, como prometi, ao tema que abordei na última edição deste jornal e que tanta tinta tem feito correr e verbalizar opiniões. Não se trata de um assunto consensual para os portugueses nem para os políticos ativos. Recordo a minha opinião: Não defendo uma imigração desregulada, mas que se estabeleça um acordo entre os países da União Europeia para que os fluxos migratórios se possam distribuir com equidade. Que os imigrantes sejam devidamente identificados e assegurados os seus meios de subsistência e lhes seja garantido, sempre que desejado, o direito ao reagrupamento familiar, de imediato ou quando o imigrante considerar necessário. A negação deste reagrupamento é uma desumanidade. Todavia, não tenhamos ilusões quanto à continuação da existência de imigrantes indocumentados. Como os regulares, estes fogem da guerra e de condições de vida indignas. Na procura de outras paragens que lhes assegurem mais segurança e melhor subsistência, inconscientemente, caem na alçada de redes de tráfico humano, que os deixam ao “Deus dará” num país qualquer.

Quanto aos imigrantes regularizados como aos indocumentados as nossas IPSS têm uma missão a realizar, envolvendo outras Organizações estatais e/ou particulares. Há já as que têm experiência nesta área e poderiam servir, como referência de boas práticas, para outras suas congéneres. Bastaria que colocassem no site da instituição os procedimentos que tiveram para humanizar a vida de imigrantes indocumentados e vítimas de exploração laboral. O caso que conheço e foi alvo de reportagem dos media é o da Cáritas Diocesana de Beja.

As IPSS, sobretudo nos meios mais urbanizados, têm maiores possibilidades de se aperceber das situações indignas em que vivem os imigrantes, porque estão mais próximas das situações que as rodeiam. Sem querer coartar as boas práticas que já existem, e que deveriam ser partilhadas, nem dar soluções dogmáticas, pois as realidades sociais, culturais e económicas, são muito distintas, aceitem o meu contributo, como meras propostas, que passo a enunciar:

1.º Quando se conhecerem casos de exploração de mão-de-obra, condições indignas de habitabilidade, indícios de tráfico humano, levar o problema ao Conselho Local de Freguesia (CLF) e/ou à Rede Social (RS) para se encontrar a melhor forma de denunciar os inumanos exploradores, assegurando o não repatriamento dos indefesos imigrantes que apenas procuraram melhores condições de subsistência. Se não houver CLF ou RS que a instituição tenha a coragem de apresentar a situação às autoridades competentes;

2.º Mesmo que haja a barreira do idioma, nunca recusar o acolhimento ao imigrante na prestação de serviços na instituição ou no domicílio. Parafraseando o Papa Francisco, algumas vezes as IPSS podem ter que ser como «um hospital de campanha, depois de uma batalha, como é inútil perguntar a um ferido pelo nível de colesterol ou d açúcar! É preciso tratar-lhe das feridas. Do resto falamos mais tarde…»[1];

3.º O imigrante não traz consigo só “feridas”. Também chega com os seus saberes culturais, etnográficos e gastronómicos. que serão, decerto, uma riqueza para os autóctones e possibilidade objetiva de integração.  

Permitam-me os responsáveis por este jornal a ousadia de propor que procurem descobrir boas práticas que já estão a acontecer em algumas IPSS e façam a reportagem para que outras se entusiasmem e será dado, assim, um contributo para a humanização do nosso país.

Serei utópico? Creio que não.

 

[1]

 

Data de introdução: 2025-08-07



















editorial

DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E SOLIDARIEDADE

O princípio da dignidade da pessoa humana é central na Doutrina Social da Igreja. Também na Social Democracia. Nesta (DSI), o princípio da dignidade deriva da convicção de que cada ser humano é criado à imagem e...

Não há inqueritos válidos.

opinião

EUGÉNIO FONSECA

As IPSS têm que ser espaços de inclusão
A identidade das nossas Instituições de Solidariedade Social fica posta em causa se, por qualquer razão, fizerem aceção de pessoas. A matriz solidária obriga...

opinião

PAULO PEDROSO, SOCIÓLOGO, EX-MINISTRO DO TRABALHO E SOLIDARIEDADE

Contrarreforma laboral: a precariedade nunca existiu
Desde a mudança de paradigma ocorrida com a aprovação do Código de Trabalho em 2003, os governos têm privilegiado mudanças graduais na legislação...