CENTRO SOCIAL E PAROQUIAL DE SANTO VARÃO, MONTEMOR-O-VELHO

Sonho e necessidade de uma ERPI esbarra na impossibilidade financeira

O Centro Social e Paroquial de Santo Varão é uma pequena instituição do concelho de Montemor-o-Velho, mas essencial no apoio a uma população envelhecida e cada vez mais dependente. Construir um lar é um sonho que, em caso de concretização, iria dar resposta a uma franja da população que precisa, cada vez mais, de cuidado e cuidados permanentes. No entanto, a situação da instituição não permite avançar e, segundo os responsáveis pelo Centro, há que esperar por melhores tempos e apoios do Estado.
Foi em 1989 que a instituição surgiu, ainda e apenas como Centro de Convívio Nossa Senhora do Amparo e ligada à Cáritas Diocesana de Coimbra.
No ano seguinte, com a aprovação e reconhecimento dos estatutos, a instituição emancipou-se, alargou as respostas e estabeleceu-se como Centro Social e Paroquial de Santo Varão.
Assim, diz a história que em 2020 celebra 30 anos de vida ao serviço da comunidade, com as respostas de Centro de Convívio (20 utentes), Serviço de Apoio Domiciliário (15) e Centro de Dia (15).
Atualmente, o Centro fornece ainda cerca de 30 refeições diariamente a uma outra instituição privada do concelho.
“Estas valências surgiram para responder às necessidades da comunidade e também para dar alguma sustentabilidade à instituição”, explica Andreia Mendes, diretora-técnica do Centro de Santo Varão, que lembra ainda a necessidade, por diversas razões, de haver uma Estrutura Residencial Para Idosos (ERPI).
“Esta comunidade está muito envelhecida. A freguesia tem duas áreas, Santo Varão, muito mais envelhecida e pessoas menos autónomas, e Formoselha, que tem mais habitantes e mais novos”, afirma o padre António Domingues, a propósito da necessidade de uma resposta residencial.
“As pessoas quando necessitam de uma resposta de lar têm que procurar aqui à volta, onde há respostas, mas que ainda assim são insuficientes. Os lares que há aqui há volta estão todos lotados e com listas de espera enormes”, revela Andreia Mendes, que sublinha a necessidade de haver uma resposta de lar, algo que os próprios utentes das outras respostas pedem.
“Apesar de haver alguns lares e até uma Unidade de Cuidados Continuados, aqui em Pereira, não há capacidade de resposta às necessidades da comunidade”, reforça o presidente da instituição.
É que os cuidados que as pessoas que chegam ao Centro são de tal forma exigentes que as respostas sociais, por vezes, não são as mais adequadas.
“Por exemplo, os utentes do Centro de Convívio têm alguma autonomia, mas os do Centro de Dia poucos ou quase nenhuns a têm. São mesmo muito dependentes, bons candidatos a uma vaga de lar”, argumenta a diretora-técnica.
“Eu sou pároco desde aqui até Ribeira de Frades, ou seja, das comunidades todas ao longo da linha de comboio, e não nos podemos queixar de falta de população, mas são zonas essencialmente dormitório. Têm muita gente, mas a mais residente está muito envelhecida. Por exemplo, o número de funerais é exponencial face ao número de batismos. É uma comunidade envelhecida que agora começa a integrar estes novos residentes. Ainda assim, ao contrário de outras zonas que têm muito menos população”, acrescenta o padre António Domingues.
Apesar de ser uma região rural, onde impera a cultura do arroz, o facto de a linha do comboio atravessar a freguesia, permitiu à população procurar outra vida, outros empregos. Daí que não seja uma população especialmente desfavorecida.
“Não é, de facto, uma comunidade com muitas necessidades, fruto do que acontecia no passado com a linha do comboio. As pessoas tinham hipótese de ir trabalhar para outros centros, como Coimbra ou Figueira da Foz, e hoje têm a sua reforma e o seu pé de meia. E isso reflete-se nas comparticipações”, indica o padre António Domingues.
Ainda assim, segundo a diretora-técnica, há muitas situações de utentes com rendimentos muito baixos: “Temos também uma parte dos utentes que tem pensões muito baixinhas, aqueles que trabalhavam no arroz. E, depois, temos os ex-funcionários da CP, que conseguem ter umas pensões um bocadinho melhores. Os rendimentos não são muito baixos, porque apesar de ser um concelho essencialmente rural, Santo Varão tem a linha do comboio que ajudou bastante as pessoas a terem outras alternativas de vida que não o campo”.
E o reflexo nas compartições, como referiu o presidente da instituição, faz com que a situação financeira do Centro seja “estável”.
“Neste momento é estável, mas também não ficamos só à espera da verba que vem da Segurança Social e fazemos diversas atividades com o intuito de angariar fundos”, sublinha Andreia Mendes, que enumerou algumas: “No ano passado arrancámos com o Arroz Doce Solidário, em que uma vez por mês fazemos arroz doce para fora. As pessoas trazem o prato à sexta-feira e no sábado levam, com o dinheiro a reverter para a instituição. E esta é também uma forma de envolver a comunidade na vida da instituição. Temos donativos, em espécie e monetários, e a própria comunidade vai ajudando. Depois temos três voluntárias que fazem muitos trabalhos para a instituição que depois vendemos. Para além disso, participamos com uma quermesse na Feira de S. Martinho e no festival gastronómico da freguesia, entre outras iniciativas que vão acontecendo”.
Sobre os donativos, uma realidade cada vez mais rara, a diretora-técnica diz que é mais uma ajuda, mas também têm vindo a diminuir.
“Têm vindo a decrescer e são donativos pequenos, normalmente dados uma vez por ano, mas são donativos pequenos, o maior que recebemos foi de 50 euros. Temos também a consignação do IRS e, muito importante, são os trabalhos feitos pelas voluntárias e pelos idosos que vamos vendendo. São porta-chaves, naperons, panos de cozinha, doce de abóbora, etc.”, refere, acrescentando: “Vamos procurando outras fontes de receita para além do que vem da Segurança Social, até porque, cada vez mais, o que nos é dado pelo Estado não é suficiente para as necessidades que temos e para as exigências que nos fazem, que cada vez são mais e maiores”.
No entanto, apesar da situação financeira ser estável e equilibrada, não dá para avançar para o lar.
“Esse é um sonho que temos, mas a conjuntura atual não é favorável e sem apoios do Estado dificilmente conseguimos meter mãos à obra, por muita boa vontade que tenhamos. É um desejo, mas torná-lo realidade é muito complicado”, lamenta a diretora-técnica, que destaca a vantagem que seria para um maior equilíbrio de contas: “O lar, para além de tudo, daria outra sustentabilidade à instituição, porque o Centro de Dia é uma resposta social muito inconstante. Tanto podemos ter casa cheia, como, se falecerem dois ou três utentes, as coisas complicam-se, porque as despesas mantêm-se, o pessoal é o mesmo, etc.. O lar dar-nos-ia alguma sustentabilidade, porque seguramente estaria sempre cheio. E dar-nos-ia mais segurança, porque o Centro de Dia é uma resposta muito incerta”.
À variação do número de utentes, Andreia Mendes acrescenta a comparticipação do Estado para aumentar as dificuldades de sustentabilidade da resposta: “Para além disto, a comparticipação do Estado não é suficiente. Os idosos quando aqui chegam já vêm muito debilitados e com uma grande dependência. Alguns em tom de brincadeira até dizem que era bom haver umas camas onde pudessem passar as noites”.
A estas dificuldades, a responsável técnica acrescenta as de alargamento de vagas no SAD.
“As pessoas gostam de se manter em casa e nós para conseguirmos alargamento do acordo é muito difícil, porque implica muita burocracia… Temos capacidade para 15 e temos 15 utentes, mas há mais gente a querer, porque as pessoas preferem manter-se em casa”, explica.
Outra dificuldade que a instituição tem sentido é com o quadro de pessoal.
“É cada vez mais difícil termos estabilidade a nível de funcionários que permita alguma tranquilidade. Cada vez é mais difícil encontrar pessoas para este tipo de trabalho”, lamenta o padre António Domingues, ao que Andreia Mendes acrescenta: “Pelo que me dá a perceber, não é um trabalho muito bem visto, especialmente pelos jovens. Sistematicamente temos situações de baixas, o que para nós é difícil colmatar. Arranjar pessoas de um dia para o outro não é fácil”.
A isto junta-se o facto de os salários serem pouco atrativos, o que, em zonas em que a oferta de emprego existe, torna a contratação difícil.
“Sim e, depois, a atualização dos acordos de cooperação é insignificante. O salário mínimo vai aumentar 35 euros, mas a atualização não acompanha este custo. Por exemplo, no Centro de Dia a comparticipação é de cento e poucos euros, mas os utentes são cada vez mais dependentes e só não dormem cá”.
E se o sonho é a construção de um lar, outros projetos mais pequenos estão na mente dos responsáveis pelo Centro, como a construção da garagem para as carrinhas.
“O edifício onde funciona a instituição era antigamente a casa paroquial e, no fundo, temos que nos adaptar ao que o espaço nos dá. O ideal era termos outro edifício, mesmo não abrindo o lar, construído com este propósito. Vamos ver o que conseguimos fazer. Para já estamos a legalizar o equipamento que temos”, revela o padre António Domingues.
Andreia Mendes lembra ainda a implementação das medidas de autoproteção, que “já estão quase todas, porque são muitas as exigências e é tudo muito caro”.
E como seria Santo Varão sem o Centro Social e Paroquial?
“Seria mais pobre, pois o Centro ajuda a dinamizar a comunidade”, diz Andreia Mendes, com o padre António Domingues a corroborar a ideia: “A nível dos idosos e dos doentes seria muito mais complicado viver em Santo Varão. E muitas pessoas não têm retaguarda familiar, porque os filhos estão longe, e somos nós que temos que tratar de tudo. Seria mais pobre para os mais pobres. Até a própria comunidade seria mais pobre, porque assim as pessoas envolvem-se e é uma forma que têm de viver a caridade prática”.
A instituição faz ainda empréstimo de ajudas técnicas, essencialmente, camas articuladas, não apenas à freguesia, mas também a todo o concelho.
“Não emprestamos mais cadeiras de rodas porque elas são poucas para as necessidades que temos na instituição, devido à dependência dos nossos utentes”, argumenta Andreia Mendes.
Localizado numa das zonas mais afetadas pelas cheias de dezembro de 2019, o Centro Social e Paroquial de Santo Varão, no concelho de Montemor-o-Velho, funcionou quase normalmente, a não ser ter ficado privado de algumas funcionárias que não conseguiram chegar à instituição.
“A única consequência que sentimos foi o facto de algumas funcionárias não terem conseguido cá chegar porque a estrada estava cortada. De resto, não influenciou a vida do centro, até porque os utentes puderam vir todos”, conta o padre António Domingues, presidente do Centro, ao que a diretora-técnica Andreia Mendes acrescenta: “Funcionámos, mas, de facto, ficámos isolados. A maior parte das estradas estavam cortadas e era muito difícil e demorado cá chegar. Isto durou quatro dias”.

 

Data de introdução: 2020-02-28



















editorial

NO CINQUENTENÁRIO DO 25 DE ABRIL

(...) Saudar Abril é reconhecer que há caminho a percorrer e seguir em frente: Um primeiro contributo será o da valorização da política e de quanto o serviço público dignifica o exercício da política e o...

Não há inqueritos válidos.

opinião

EUGÉNIO FONSECA

Liberdade e Democracia
Dentro de breves dias celebraremos os 50 anos do 25 de Abril. Muitas serão as opiniões sobre a importância desta efeméride. Uns considerarão que nenhum benefício...

opinião

PAULO PEDROSO, SOCIÓLOGO, EX-MINISTRO DO TRABALHO E SOLIDARIEDADE

Novo governo: boas e más notícias para a economia social
O Governo que acaba de tomar posse tem a sua investidura garantida pela promessa do PS de não apresentar nem viabilizar qualquer moção de rejeição do seu programa.