PROTOCOLO DE COOPERAÇÃO 2010

Acordo em tempos de crise

O Protocolo de Cooperação de 2010 foi assinado a escassos dias do fim do ano, depois de longas, difíceis e hesitantes negociações entre o Governo e as representantes do sector social solidário. Em Novembro o padre Lino Maia, presidente da CNIS, anunciava no jornal Solidariedade que “a cooperação está ferida de morte”. O golpe fatal era dado pelo anúncio do fim do regime da retribuição do IVA às IPSS, como medida de poupança de cerca de 100 milhões de euros. A Cooperação afinal não morreu. Sobreviveu mesmo nas últimas e veio a público, no dia 21 de Dezembro, sob a forma do protocolo que aqui se analisa.

O atraso na obtenção do acordo não tem grandes repercussões no financiamento das IPSS, apesar de dizer respeito ao ano de 2010, uma vez que não há alterações em relação aos valores que são praticados na cooperação com as instituições. Os valores das respostas sociais não sofreram alterações substanciais relativamente a 2009 e, por isso, a aplicação retroactiva não terá consistência prática.
Os valores de comparticipação da Segurança Social, mantêm-se, de facto, idênticos aos valores de 2009. Há algumas alterações, que justificam a existência de um novo protocolo, não em valores de comparticipação, mas em alterações relevantes na filosofia da cooperação e em matéria de financiamento por via das comparticipações familiares.

Uma das novidades deste Protocolo já estava inscrita no documento de 2009, mas como foi suspensa a entrada em vigor do novo Código Contributivo da Segurança Social, acabou por não ter aplicação até agora. Vai ter, seguramente, nos próximos exercícios. A partir de Janeiro de 2011, com a entrada em vigor do referido código, aumentarão os valores das comparticipações da Segurança Social, nas várias respostas sociais, na proporção do aumento gradual da taxa social única paga pelas instituições. O protocolo estabelece que os valores das comparticipações serão actualizados em 0,4 por cento em 2011 e continuarão a ser até que a taxa social única paga pelas IPSS atinja o valor normal.

Outra novidade é o valor de referência que é fixado relativo a à resposta social de lar de idosos. Foi fixado em 869.91 euros mensais por utente. Em 2009 era de 775,77 euros e em 2008 de 756,11 euros. Há uma alteração significativa do valor, o que tem influência na comparticipação dos idosos e suas famílias pela frequência dos lares. Não há aumentos das comparticipações da Segurança Social, mas permite, por esta via, que as IPSS aumentem as comparticipações dos utentes e famílias nos novos contratos por referência ao novo valor. Um valor, diga-se de passagem, ainda muito aquém do que a CNIS considera ser o custo real. Desde 2008 está calculado entre 950 e os mil euros mensais.

No actual Protocolo está previsto que a Segurança social poderá proceder à ocupação de 10 por cento das vagas nos lares de idosos em funcionamento e nos construídos sem recurso a financiamento público e até 20 por cento nos que tiveram apoio estatal. É já uma prática do ISS que impõe, nas negociações de novos acordos de cooperação, que haja uma quota para situações de emergência social. Têm-se verificado algumas situações de incompatibilidade na convivência de utentes por falta de rigor na selecção dos casos por parte da Segurança Social. Este direito da Segurança Social tem sido causa de algum desconforto e de alguma diminuição da qualidade de vida dos utentes institucionalizados. Neste Protocolo ficou previsto que haja uma avaliação conjunta das situações de acolhimento de complexidade acrescida associadas a situações graves de carácter degenerativo, doença mental ou deficiência, prevendo-se recurso para as comissões distritais nos casos de discordância. Deve salientar-se também que em relação a essas vagas a Segurança Social assegura que pelo menos o valor de referência é recebido pelas instituições relativamente a estes idosos. Positivo é também o valor que as IPSS podem receber por utente no lar de idosos que ia até 125 por cento do valor de referência e que agora passa a 150 por cento desse valor.

No protocolo de 2010 é ainda estabelecida uma interpretação mais ajustada do ponto de vista da fixação das comparticipações familiares porque faz entrar no cálculo da comparticipação os rendimentos do agregado familiar e não só do próprio utente. È relevante no que diz respeito ao lar de idosos, mas o critério foi estabelecido para todas as valências e refere ainda que a recusa na entrega da documentação, concede legitimidade à IPSS de aplicar a comparticipação máxima relativa ao utente. Um outro critério que é vinculado ao protocolo, a que a Comissão de Acompanhamento, quando vier a regulamentar esta matéria terá que obedecer, é que não serão considerados encargos com rendas e prestações com habitação no cálculo do rendimento per capita do utente quando na habitação ou residência não permaneça mais nenhum idoso. Trata-se de uma interpretação que consagra a posição que as IPSS vinham defendendo desde há muito tempo e que é relevante do ponto de vista da sustentabilidade das respostas sociais.

Importante, sobretudo para as IPSS da Infância e Juventude, é o facto da comparticipação dos utentes não ter de – as IPSS mantêm a faculdade de, nos seus regulamentos internos, preverem reduções por este motivo - sofrer qualquer redução quando no mesmo estabelecimento estejam mais do que um elemento do mesmo agregado familiar.
Há outras questões interessantes no texto. Muitas das matérias sensíveis foram diferidas para a Comissão Nacional de Acompanhamento e Avaliação dos Protocolos e Acordos de Cooperação, no estabelecimento dos procedimentos em relação a essas matérias, nomeadamente quanto à apresentação de informação por parte das instituições aos serviços do ISS, perante a fixação e revisão dos custos das respostas sociais. Aumentou-se muito o nível de competências da Comissão Nacional e estabeleceram-se mecanismos que vão provocar o efectivo funcionamento da Comissão. Nos últimos anos praticamente não funcionou por culpa dos governos que não a convocavam. Agora estão estabelecidos formas de promover as reuniões mesmo quando o governo não toma iniciativa. Com este reforço de competências é uma vantagem haver uma instância paritária que só funciona e delibera com consensos entre as duas partes, mas que pode dirimir tudo o que é matéria mais sensível no âmbito do Protocolo.

E não é despicienda a reafirmação do direito das Uniões Distritais das IPSS serem beneficiárias de apoios financeiros para a reorganização ou reforço de actividade das suas estruturas. Já estava no protocolo anterior mas não teve tradução prática durante o ano de 2010. Manteve-se essa previsão com a indicação de que desta vez o governo vai levar a cabo a aprovação das candidaturas apresentadas pela CNIS.
Outro dos aspectos interessantes que ficou plasmado no texto é a possibilidade de revisão do valor de referência se ocorrerem circunstâncias extraordinárias que agravem de forma significativa os custos de financiamento. É o que tem acontecido, e provavelmente vai voltar a acontecer, por efeito da aplicação do novo salário mínimo nacional. Há muitas instituições que serão abrangidas quando ele chegar aos 500 euros, sobretudo os trabalhadores dos três níveis mais baixos de remuneração. É um grupo muito denso que terá aumentos superiores à inflação por via da actualização da remuneração mínima mensal garantida. É uma alteração excepcional que vai provocar o aumento substancial dos custos de funcionamento, designadamente dos lares de idosos, e pode justificar - não obstante o protocolo preveja que durante três anos esse valor não será reavaliado, sendo actualizado de acordo com a inflação -, uma reavaliação extraordinária, revendo o valor de referência por aumento dos custos de funcionamento provocado por uma medida legislativa governamental.

Por último, mas não menos importante, o governo reconhece que é menos competente na gestão de equipamentos sociais e ficou estabelecida uma disposição programática no sentido de confiar às instituições particulares de Solidariedade Social os equipamentos que ainda permaneçam em gestão directa dos serviços do Estado. Sobretudo nas áreas da deficiência, lares de idosos e centros infantis.
Como afirma o presidente da CNIS, padre Lino Maia, não é o Protocolo desejável, mas é o Protocolo possível. É um acordo em tempos de crise.

 

Data de introdução: 2011-01-07



















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