CNIS AFIRMA DISPONIBILIDADE PARA APOIAR NO TERRENO

O papel do cuidador informal é insubstituível

Quando está de regresso ao debate público a questão do estatuto do cuidador informal, a CNIS considera que é essencial “reconhecer a importância” desses prestadores de cuidados e, relembra que as instituições sempre estiveram na linha da frente no apoio a essas pessoas e àquelas que elas cuidam, reafirmando “a disponibilidade das IPSS para apoiar futuras medidas que visem ajudar essas pessoas, que se estimam em centenas de milhar. Quanto ao estatuto do cuidador informal, defende que este não deve contribuir para o isolamento e desgaste ainda maior da pessoa que cuida, devendo sim envolver a família, os vizinhos e os voluntários, que são os grandes prestadores de cuidados no domicílio.
Com a recente chegada ao Parlamento da proposta de alteração à Lei de Bases da Saúde, aprovada em Conselho de Ministros, em dezembro último, voltou de novo a discussão sobre o estatuto do cuidador informal.
De momento, a proposta do Governo e ainda as outras quatro de outros tantos partidos políticos estão em discussão na Comissão Parlamentar de Saúde, num esforço para conseguir um amplo consenso pedido pelo Presidente da República.
O cuidador informal é uma realidade que atravessa Portugal, estimando-se que a maioria dos cuidados prestados a pessoas dependentes sejam efetuados por cuidadores informais.
Aliás, a caracterização desta realidade está, de alguma forma, feita, estimando-se que cerca de 800 mil pessoas cuidem de outras tantas que são dependentes. Por outro lado, um estudo encomendado pelo Governo e concluído em janeiro de 2018 concluiu que o valor económico das horas de trabalho dos cuidadores informais que cuidam, em casa, de idosos, de indivíduos com demência ou com doenças crónicas e de crianças com patologias graves vale quase 333 milhões de euros por mês, cerca de quatro mil milhões de euros por ano.
Ora, estamos perante uma realidade que a maioria da população já experienciou no seio da sua família, seja no caso de idosos, seja no caso de pessoas deficientes, seja ainda no caso de patologia.
Importa dizer que, apesar de ainda não ser dado o passo para a criação do estatuto do cuidador informal, a proposta do Governo inclui a primeira referência a estes prestadores de cuidados.
A proposta da Comissão de Revisão da Lei de Bases da Saúde, que data de 1990, liderada por Maria de Belém Roseira, previa a introdução de um artigo inteiro dedicado aos cuidadores informais, no qual era promovido “o papel da família, das pessoas próximas e da comunidade na saúde e no bem-estar das pessoas com doença”, estabelecendo, assim, o estatuto dos cuidadores informais.
No entanto, pela a primeira vez, a (proposta de) Lei de Bases da Saúde inclui uma referência a estas figuras.
«A política de saúde deve incentivar a adoção de medidas promotoras da responsabilidade social, individual e coletiva, nomeadamente apoiando voluntários, cuidadores informais e dadores benévolos», lê-se no articulado da lei.
«A proposta de lei não contempla uma base específica para o cuidador informal, porque é uma matéria intersectorial, envolvendo várias áreas do governo, nomeadamente Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Educação ou Finanças, com quem terá de haver uma articulação próxima», justificou o Ministério da Saúde.
Para já, a ideia é avançar com um projeto-piloto para atestar das virtudes do modelo e, então, expandi-lo, tentando abranger o maior número de pessoas possível.

PAPEL IMPORTANTE

Para a CNIS, é essencial “reconhecer a importância dos cuidadores informais” na prestação de cuidados a uma vasta população, que inclui idosos, doentes e deficientes, mais ou menos dependentes, como refere o padre Lino Maia, reafirmando a “disponibilidade das IPSS para apoiar” esse enorme grupo de prestadores de cuidados.
Na maioria dos casos, estes cuidadores informais são elementos da família, vizinhos e voluntários, esmagadoramente mulheres.
“A CNIS conhece bem quem são, o que fazem e as consequências do que fazem os cuidadores", sustenta Maria João Quintela, membro da Direção, acrescentando: “Temos noção da sua importância e achamos de toda a pertinência valorizar e reconhecer as múltiplas dimensões do trabalho que desenvolvem os cuidadores informais, maioritariamente num contexto familiar e domiciliário”.
Por outro lado, “há necessidade absoluta em reconhecer o papel das famílias, dos vizinhos e dos voluntários, que são os mais diretos prestadores de cuidados, a quem não é dada preparação ao longo da vida”.
Para Maria de Lurdes Pombo, igualmente da Direção da CNIS, “o papel dos cuidadores informais é extremamente importante no caso da deficiência”.
Para a dirigente com o pelouro da deficiência, “quando nasce uma criança deficiente ela representa um peso muito grande para a família, pois é um grande sofrimento para os pais e é algo que lhes muda a vida”.
De facto, quando chega um novo membro à família que é portador de uma qualquer deficiência, “após o luto que todos os pais fazem”, fruto do choque nas suas vidas, “quase sempre a mãe abdica de trabalhar para cuidar do filho”.
Aliás, estima-se que cerca de 200 mil pessoas, na esmagadora maioria mulheres, cuidam de outrem a tempo inteiro.
“Na deficiência são os pais os cuidadores, muito em especial a mãe”, reforça Maria de Lurdes Pombo, sublinhando que “é preciso ajudá-los com apoio psicossocial, porque são pessoas sofridas, e, pelo menos, uma vez por ano dar-lhes férias”.

ESTATUTO

Estas são algumas das questões que diversos movimentos, da sociedade civil e de partidos políticos, gostariam de ver vertidas no tão desejado estatuto do cuidador informal.
Pretende-se que o estatuto do cuidador informal contemple, essencialmente, uma carreira contributiva para os cuidadores, um aumento dos apoios sociais, uma vez que os existentes são considerados insuficientes (no caso de o cuidador deixar de trabalhar os seus rendimentos caem drasticamente, colocando em risco, de pobreza e não só, tanto cuidador como a pessoa cuidada) e, entre outras questões mais, que sejam assegurados períodos de descanso para quem cuida.
Para Maria João Quintela, o “estatuto do cuidador não deve apagar, omitir ou tornar redutor o conceito de família e de solidariedade intergeracional”, lembrando que “todos somos cuidadores, maioritariamente filhas, cônjuges, noras, sobrinhas, filhos e netos e, em muitos casos, pessoas idosas”, especialmente quando a família está longe e restam apenas os mais velhos.
“O estatuto dos cuidadores informais deveria relevar não apenas uma pessoa, mas um conjunto de respostas que ajudem essa pessoa a ter uma vida o mais normal possível, no limite que não deixe de trabalhar, que não entre em «burn out» e que possa continuar a ter uma vida para além do cuidado que presta”, sustenta, acrescentando: “Deve procurar-se envolver nos cuidados o maior número de familiares disponíveis, no sentido de não isolar o/a cuidador/a e a pessoa cuidada do seu meio sociofamiliar natural. Se defendemos que a complexidade dos cuidados às pessoas dependentes precisa de uma abordagem pluridisciplinar, integrada, em que várias disciplinas concorram para estabelecer um plano individual, que seja ele próprio avaliado de tempos a tempos, não se deve responsabilizar apenas uma pessoa, que já de si entra muitas vezes em situação de esgotamento, de depressão, de incapacidade financeira e de relacionamento social, entre muitas outras”.
Para a especialista em Geriatria, “estas pessoas precisam de uma rede de apoio multidisciplinar, de que os cuidadores devem fazer parte integrante”.
Por outro lado, e reforçando a importância de a atribuição do estatuto a determinada pessoa não dever contribuir para um ainda maior isolamento dessa pessoa, a dirigente da CNIS responsável pelas matérias da saúde e do envelhecimento questiona: “Há ainda uma outra questão a considerar que é saber quem é o cuidador/a principal? Por exemplo, numa família em que há um filho que está presente e que cuida, e que até cuida bem – porque nunca podemos esquecer questões como maus-tratos, negligência ou violência física ou financeira –, mas não tem capacidade financeira para o fazer. Porém, há um outro irmão/ã que está emigrado/a e que tem alguma disponibilidade financeira e até comparticipa. Neste caso, quem é o cuidador principal?”.
Segundo a médica geriatra, “é necessário, no quadro do estatuto do cuidador, clarificar quem são os cuidadores, qual a definição de cuidador, pessoa cuidadora, cuidador informal, família cuidadora, etc., e definir se são os cuidados que são informais ou se são os cuidadores”. Por outro lado, “definir se o estatuto se refere à existência de um/a único/a cuidador/a e quais os critérios de eleição, apoio e acompanhamento desse cuidador/a, nomeadamente, no sentido de prevenir o seu isolamento e exaustão e promover a sua capacitação e um maior envolvimento de outros familiares, não os desvinculando da sua vontade e possibilidade de cuidar”, argumenta.

INFORMAÇÃO/FORMAÇÃO

E se na essência um cuidador de um idoso é, de certa forma, diferente da do cuidador de uma pessoa deficiente ou com patologia incapacitante, dentre inúmeros outros pontos de contacto há um que é transversal: a necessidade de informação/formação.
“Devia haver pequenos cursos que os pais pudessem frequentar”, defende Maria de Lurdes Pombo, também presidente da APPACDM de Castelo Branco, sugerindo: “Devia dinamizar-se sessões de formação na comunidade, cursos que fossem promotores de boas práticas”.
Por seu turno, Maria João Quintela enfatiza a necessidade de, “sempre que seja possível, envolver e reconhecer mais elementos que prestam cuidados, sejam familiares ou voluntários, que devem receber informação e formação”.
A dirigente da CNIS e presidente da Associação Portuguesa de Psicogerontologia (APP) relembra que, “volvida mais de uma década, são principalmente as IPSS que têm vindo a desenvolver ações sistemáticas e sistematizadas dirigidas aos chamados cuidadores informais, no sentido da sua formação e informação, e de envolvimento na prestação dos cuidados”, indicando a colaboração da CNIS com a Sociedade Portuguesa de Geriatria e Gerontologia (SPGG) e a sociedade espanhola congénere (SEGG) no desenvolvimento de cursos online para “Cuidadores de Pessoas Idosas com Dependência», e que, no último ano, envolveu mais de 3.200 formandos.
Maria de Lurdes Pombo reforça a importância e a disponibilidade de as IPSS apoiarem estes cuidadores, conhecedora da dura realidade de tantas famílias albicastrenses que têm um membro portador de deficiência.
“Nós, instituições, também temos a obrigação de apoiar estes pais”, afirma.
“As IPSS já são, muitas vezes, esse apoio e complemento que os cuidadores informais necessitam”, sustenta Maria João Quintela, recordando a proximidade e recursos técnicos e humanos que as IPSS dispõem e ainda que muitos idosos e deficientes são acolhidos nas instituições, que os cuidam durante o dia, sendo que em última instância o cuidador é a família, quando existe e/ou se interessa, ou os vizinhos, para junto de quem regressa ao início da noite.
Em resumo, Maria João Quintela considera que “é absolutamente legítimo e necessário relevar o papel das famílias, dos vizinhos e dos voluntários e dos mais diretos prestadores de cuidados a idosos e a pessoas com deficiência cuja dependência é elevada”, pois “o seu papel é insubstituível e as necessidades avassaladores (em termos de saúde, situação económica e de trabalho), porém, conclui: “Não podemos esquecer que esta medida só por si não resolve a problemática dos mais idosos e dos mais dependentes. Isto quer dizer que as políticas dirigidas a estas situações de dependência e deficiência são essencialmente multidisciplinares, interministeriais e integradas. Se não for assim, pode-se dar um estatuto à pessoa, mas nada muda, sendo necessário garantir que outros não se demitem dos cuidados e que esse/a é o/a melhor cuidador/a”.
As propostas de alteração à Lei de Bases da Saúde estão agora em discussão na Comissão Parlamentar de Saúde, de onde sairá um ou mais diplomas para serem votados em plenário.

Pedro Vasco Oliveira

 

Data de introdução: 2019-02-06



















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