EDITORIAL

Eleições para ultrapassar crises?

1. O país está simultaneamente confrontado “com uma crise política, uma crise económica e uma crise social”.
O diagnóstico há muito estava feito: a situação social dá abundantes sinais de “agravamento com mais de 600 mil desempregados e com o aumento das situações de pobreza e da precarização do emprego, sobretudo entre os jovens”. A cada novo dia mais palpável se torna a “degradação da situação política nacional, com a ausência de confiança recíproca entre as forças políticas e com a situação extremamente grave no que se refere ao desequilíbrio das contas públicas, das contas externas, do financiamento externo e da dívida pública”. Paralelamente, a descredibilização conjuga-se com uma indisfarçável resignação.

O almejado detonador foi o “chumbo” na Assembleia da República do quarto Programa de Estabilidade e Crescimento: o Primeiro-Ministro reconheceu não ter condições para governar e apresentou ao Senhor Presidente da República a sua demissão. Seguiram-se os procedimentos habituais: os Partidos foram chamados a Belém e reuniu-se o Conselho de Estado.

Total unanimidade: dissolução do Parlamento e convocação de eleições legislativas.
Nada que há muito não fosse veladamente anunciado e por muitos desejado.
Dir-se-á que um novo período eleitoral ocorre em momento muito mau; parece todavia que todos para ele foram dando as suas achegas. Também parece que já não somos capazes de viver senão em ciclos eleitorais, nós que em tal matéria tão doutos nos revelamos!
Porém uma pergunta paira no ar e fica por cá a atormentar-nos: “só através da realização de eleições e da clarificação da situação política poderão ser criadas condições favoráveis”?

2. “A realidade de hoje é sonho de ontem”. Se assim é, há décadas que por cá se anda a sonhar mal. Nem o regime democrático, nem a entrada na então Comunidade Económica Europeia e nem a adesão à moeda única trouxeram magicamente a desejada abundância, a confortável cultura da responsabilidade e o necessário suporte ético e ideológico. Tão depressa se consolidou o regime democrático em Portugal como bem cedo ele envelheceu. Tão depressa se operou a entrada na CEE (União Europeia) como logo alguns oportunistamente se saciaram com os fundos entrados.

Tão depressa se procedeu à adesão ao euro como muitos alienadamente se imaginaram num clube de ricos que não era nem o seu nem o resultado do seu esforço ou do seu mérito. Tão depressa se ocupavam as cadeiras do poder como logo se multiplicavam os insaciáveis - e sempre os mesmos - famintos das “migalhas que caíam da régia mesa”. Foi uma transportação colectiva para um irreal “país de maravilhas”.
Porém, estes sinais são apenas a ambiência de um outro torpor colectivo em que se foi tornando patente a perda de valores e em que foi rareando a cultura da verdade, a educação para o belo, o bem e o bom, a promoção da autonomia, a vontade de preparar o país para as gerações vindouras, o envolvimento colectivo nas causas comuns e o serviço da responsabilidade. Aqui e acolá, apenas um certo culto à fractura parecia fazer distrair do continuado deslize numa apagada e vil tristeza.
É evidente que se andou a sonhar mal. É inevitável que estejamos a acordar como que apavorados no meio de um certo pesadelo.
Procurar agora culpados é estultice. É imperioso e urgente encontrar soluções.

3. Provavelmente em 5 de Junho não vai acontecer qualquer milagre que opere a maravilha do regresso colectivo a uma terra lusitana que deve ser construção laboriosa de todos…
O milagre é aquilo que o homem verdadeiramente quiser e deve começar já na pré-campanha eleitoral. Provavelmente já no interior dos Partidos com uma boa selecção de candidatos e com a assunção por todos de um ideário programático. O melhor aval para o serviço da causa comum não está tanto no “sindicato de voto” que se transporta: deve merecer mais confiança quem se dotar da força do seu crédito e da firmeza dos valores que o envolve. Os melhores, os que devem merecer o voto de todo o povo, são esses quando apontam para a cultura da autonomia de cada um, da solidariedade de todos, da corresponsabilidade colectiva, da verdade operativa, do envolvimento geral e do serviço ético...

Deixem-se as forças políticas de jogos de cadeiras de poder. Há mulheres e homens bons em todos os Partidos, como também por todos se poderão instalar aqueles que apenas sabem sonhar e ardilosamente construir a “sua oportunidade”. Ergam-se os bons e dêem-se as mãos. É com esses que as crises serão superadas e que o milagre da construção de um advento melhor para todos nesta terra será realidade.
As Instituições de Solidariedade há muito desenvolvem a sua bela missão; a CNIS também dará mais um contributo com o seu Congresso, em Santarém, nos dias 20 e 21 de Maio, vésperas imediatas da campanha eleitoral. Um rumo solidário é um rumo para um Portugal melhor.

Padre Lino Maia, Presidente da CNIS

 

Data de introdução: 2011-04-06



















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