LUÍS MARQUES MENDES NA TOMADA DE POSSE DA UDIPSS LISBOA

As IPSS cumprem uma tarefa que é verdadeiro serviço público

Luís Marques Mendes, conselheiro de Estado e comentador televisivo, foi o convidado especial da cerimónia de tomada de posse dos novos órgãos sociais da UDIPSS Lisboa, que decorreu, no passado dia 4 de março, na Associação de Beneficência «Casas de São Vicente de Paulo», na capital portuguesa.
Na sua intervenção, no encerramento da cerimónia, Marques Mendes relevou a importância do Sector Social Solidário para Portugal, numa alocução bastante esclarecedora e que teve ainda o extra do dinamismo do orador para se tornar mais eficiente: “Este sector ainda é um pouco o parente pobre, mas isso tem de mudar. Aquilo que dá autoridade para bater o pé são os resultados e as instituições têm resultados notáveis. O país tem níveis de pobreza altos, mas sem as instituições esses índices seriam muito mais altos”.
A forma como o sector é encarado e a falta de visibilidade são problemas reais, mas que, segundo o comentador, são situações que têm de ser alteradas.
“Nos recentes debates televisivos para as eleições, não vi todos, mas quase todos, de um modo geral esta área esteve ausente. Há, de facto, aqui um défice”, começou por constatar, sublinhando: “E é um défice porque basta pensar nos últimos anos em Portugal. A crise da Troika, uma crise financeira séria, com problemas sociais gravíssimos, quem deu uma ajuda notável para que a situação não fosse ainda mais grave foram as IPSS. Pandemia, outro problema seríssimo, algo que não imaginávamos que pudesse acontecer… E numa altura em que as pessoas estavam em casa, que tudo funcionava a meio gás, a situação daquelas pessoas mais vulneráveis ficava em causa! Quem ajudou de forma especialmente importante nessa ocasião foram as IPSS. Agora, com a crise da inflação e do aumento do custo de vida, que evidentemente massacrou toda a gente, mas atormentou de forma especial as famílias mais carenciadas, quem está e tem estado no terreno a dar maior ajuda são as IPSS. E isto não afetou apenas as pessoas, afetou também as instituições, que tiveram que prestar ainda mais apoio do que prestavam anteriormente para que não houvesse tanto desespero e menos desproteção social. Ou seja, em poucos anos, tudo já neste século, três crises gravíssimas e aqui se viu o peso, a importância, a sensibilidade e a solidariedade do Sector Social. E só isto devia ser mais do que suficiente para os poderes públicos acordarem! Acho que não é um problema de má vontade, mas sim de falta de sensibilidade. E é preciso mudar alguma coisa”.
Nesse sentido, o conselheiro de Estado defende que, “em função do espírito, dos resultados e do exemplo que este sector é, torna-se necessário, como diz o padre Lino Maia, um outro contrato de cidadania e político entre o Estado e estas instituições”
Evocando a proposta da CNIS para que se altere o Carta Magna, para lhe introduzir a Proteção Social como direito universal, Marques Mendes sustentou: “Se é necessário mexer na Constituição ou nas leis, diria que tudo isso é importante, mas, acima de tudo, é preciso mudar as práticas e os comportamentos. Este sector ainda é visto, em certa medida, como um parente pobre, talvez porque não faz manifestações, não tem sindicatos, não tem as formas de luta tradicionais, mas isso não pode ser motivo para discriminação. E, por isso, este comportamento tem de mudar”.
Antes, o presidente da CNIS iniciou a sua intervenção dirigindo-se a Marques Mendes, recordando que o ouviu, no seu espaço de comentário televisivo, “a defender este sector”, deixando-lhe um desafio: “Espero que o continue a fazer”.
Mais à frente, quando abordou a questão da proteção social, o padre Lino Maia voltou a solicitar ao conselheiro de Estado para dar visibilidade à proposta da CNIS para que “o Estado assuma a competência da proteção social”, lembrando que “não tem de ser o estado a executar, mas tem de assumir a proteção social de todos, porque é uma obrigação”.
Em resposta, Marques Mendes, depois de recordar que desde os seus 25 anos que está intimamente ligado às IPSS e Misericórdias, concordou com a falta de visibilidade do sector social solidário.
“Num país que tem tantos comentadores, eu talvez seja o único que, de vez em quando, fala das IPSS e Misericórdias. Eu percebo a sua preocupação, padre Lino Maia, com a falta de visibilidade do sector, porque mesmo quando decido falar de algumas destas matérias, lá dentro dizem-me logo se acho que vale a pena. Não fazem por mal, mas estão logo a pensar nas audiências”, revelou, dirigindo-se de seguida ao líder da CNIS: “Respondendo positivamente ao desafio do padre Lino Maia, com certeza que darei a minha ajuda para ajudar a dar visibilidade ao sector. É o que posso fazer e é o que farei, ajudar a dar visibilidade”.
O antigo governante quis ainda deixar “um outro sublinhado que tem de ser feito ao carácter decisivo do sector, com destaque para: “Em primeiro, cumpre uma tarefa que é verdadeiro serviço público. A prova provada que serviço público não é sinónimo de empresa pública, instituto público ou serviço do Estado. Serviço público pode ser desempenhado pela sociedade, que é o que fazem estas instituições. Em segundo, poupam imenso dinheiro ao Estado. Este comparticipa, subsidia, apoia, mas se tiver que agir diretamente, o Estado gasta muito mais. Em terceiro, a importância do sector no emprego, já é de facto um sector económico, sem esquecer que estas instituições desempenham um papel notável do ponto de vista da economia, do social e da ajuda ao Estado em termos de financiamento”.
E aqui, Marques Mendes destacou uma característica que é a essência do Sector Social Solidário: “É um ponto poucas vezes relevado, é que as instituições fazem o seu papel com uma sensibilidade, uma dedicação e uma generosidade, uma atenção e respeito pelas pessoas como o Estado não faria. Esta parte vem da sensibilidade da sociedade, que é de onde emanam estas instituições. E esta componente das vossas instituições não tem preço. É mais importante ainda do que os outros valores que aqui referi, como o financeiro, económico ou do emprego”.
O comentador lembrou ainda o papel voluntário de milhares de pessoas que fazem as instituições.
“Para além das instituições, do seu trabalho, da sua tarefa e dos seus resultados, há uma outra coisa essencial que as instituições fazem, que é capacidade que têm de, pelo seu exemplo, mobilizarem muitas pessoas que colocam ao serviço desta causa, da comunidade, a sua generosidade e o seu espírito de dedicação. Podem não ser pessoas notórias, mas são pessoas notáveis. Notórias, no sentido de visibilidade, mas mais importante do que isto é o trabalho. Esta componente é muito importante, porque num mundo que tende a ser, cada vez mais, egoísta e individualista, estas instituições mobilizam muito boas vontades. E não são apenas os trabalhadores e os dirigentes, o que já não era pouco, são também muitas outras pessoas, que se voluntariam para ajudar. Isto é importante porque faz a sociedade mais humana. É de pequenos contributos que se faz este ideal coletivo da solidariedade, porque senão é uma palavra oca, de retórica… Não, isto tem de ser sentido e vivido no terreno”.
Luís Marques Mendes deixou ainda uma palavra de saudação para a “Igreja Católica, que está, em grande medida, por detrás a motivar, a alavancar, a impulsionar, a inspirar a maior parte das Instituições Particulares de Solidariedade Social”, acrescentando: “A Igreja tem, historicamente, um papel notável na saúde, mas nos últimos anos tem um papel altamente notável na proteção social e da solidariedade social”.
A rematar, o conselheiro de Estado deixou uma palavra de esperança para o futuro, lembrando que “estamos a viver um tempo muito desafiante, de grande insegurança a nível mundial, com as guerras, militares e comerciais, e o futuro alargamento da União Europeia, entre outras situações, e até final da década podem surgir desafios muito delicados… e isto vai exigir enorme trabalho de toda a sociedade”, por isso, num quadro de grande incerteza à escala global, “temos de ter um ambiente de presente e de futuro de esperança e ambição”.
“Não podemos olhar para uma dificuldade e ver nela uma fatalidade. Não, temos de ver uma nova oportunidade, como fizemos ao longo dos 50 anos de democracia. Pegando no vosso exemplo no terreno, podem ter pouca visibilidade e notoriedade, mas é um exemplo notável de solidariedade e de proteção social. Olhando para isto, só temos razões para ter esperança e ambição. Mesmo com a incerteza que vivemos, podemos ter esperança e ambição e nada nos deve dividir, porque vamos precisar de todos”, afirmou Luís Marques Mendes.
Na sua alocução, o padre Lino Maia, para além dos desafios lançados ao conselheiro de Estado, pegou na importância e dimensão da UDIPSS Lisboa para evidenciar a importância das IPSS no país.
Representando cerca de 10% do total nacional do universo de IPSS, as cerca de 500 instituições do distrito de Lisboa, empregam cerca de 30 mil pessoas, apoia 70 mil utentes e conta ainda com milhares de dirigentes voluntários. Ou seja, no país inteiro, as IPSS apoiam mais de 700 mil pessoas, empregam 300 mil trabalhadores e contam com o trabalho voluntário de milhares de dirigentes.
“Não fossem as IPSS e muita gente ficaria para trás”, lembrou o presidente da CNIS, sublinhando a importância económica do Sector Social Solidário: “A Economia Social tem cerca de 60 mil entidades, mas as 5.000 IPSS têm mais de 50% da atividade económica do sector da Economia Social”.
Relacionado com a questão da visibilidade do sector, está a indiferença política.
Quando ainda se estava em campanha eleitoral para as Eleições de 10 de março, o padre Lino Maia constatava que nos debates não foi uma única vez falado o sector.
“Não será preocupação dos partidos a proteção social?”, questionou, respondendo: “Parece que não é e não fossem as IPSS e quanta gente viveria pior. No entanto, as IPSS, no silêncio, sem greves, vão resolvendo o problema e, por isso, para os órgãos do Estado o problema da proteção social está resolvido. Ou seja, as instituições fazem, está resolvido”.
Por isso, o presidente da CNIS defende que “o Estado tem de assumir a proteção social”, lembrando que, atualmente, “a Segurança Social é contributiva, mas a proteção social não é um direito universal”. Daí a CNIS defender a sua inclusão na Constituição da República Portuguesa.
“Apesar de ser assegurada pelo Sector Social Solidário, a proteção social não está a ser garantida pelo Estado”, sustentou, deixando uma ideia: “O Estado deve criar um Serviço Nacional de Proteção Social”.
Por seu turno, o empossado presidente da UDIPSS Lisboa, anotando o período eleitoral que se vivia, referiu: “É oportuno que reafirmemos o papel insubstituível que as IPSS têm como pilar estruturante do modelo português de Estado Social (…) Queremos dizer aos futuros parlamentares e membros do governo, que o Sector Social Solidário precisa que o poder político saiba e seja capaz de gerar espírito de motivação a quem está no terreno e o conhece profundamente, a quem sabe e faz mais e melhor, a quem põe as mãos na massa, a quem sente o cheiro das pessoas, a quem está perto das situações e olha os problemas olhos nos olhos”.
A finalizar, José Carlos Batalha foi afirmativo ao dizer que “nenhum governo, nenhum Estado, nenhum poder está legitimado para enfraquecer ou obstaculizar, para reduzir, controlar ou asfixiar, seja por preconceitos ideológicos ou por qualquer outro tipo de razão esta expressão organizada da sociedade civil, esta nossa realidade dinâmica, que, de alma e coração, chega onde o braço do Estado não é capaz de chegar, este nosso Sector Social Solidário”.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)

 

Data de introdução: 2024-03-13



















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