FUNDAÇÃO ADFP, MIRANDA DO CORVO

Aposta no turismo a pensar na sustentabilidade

Angariar e diversificar receitas é o propósito de toda e qualquer IPSS com ambição de servir melhor e o desejo de crescer. Há diversos exemplos bem-sucedidos e o SOLIDARIEDADE já deu conta de alguns. Um deles é o da Fundação ADFP (Assistência, Desenvolvimento e Formação Profissional), de Miranda do Corvo, cuja aposta no turismo, inicialmente apenas de Natureza, tem sido uma aposta ganha. A aquisição da Quinta da Paiva, com 12 hectares, e a criação do Parque Biológico da Serra da Lousã foram os primeiros passos em algo que tem vindo a crescer e que no final deste ano viu nascer o Hotel Parque Serra da Lousã, uma unidade de 4 estrelas.
O projeto turístico da ADFP, que arrancou com o Parque Biológico da Serra da Lousã e na recuperação de algumas artes tradicionais da região, tem tido um forte impulso nos últimos tempos e ganhou uma nova dimensão.
“Há cerca de 10 anos tentávamos fazer uma recolha de peças já em desuso entre a população para criar um museu etnográfico, mas quando foi possível construir a infraestrutura afigurou-se necessário evoluir o conceito do mesmo”, começa por explicar Nancy Rodrigues, responsável pelo Gabinete de Inovação e Imagem, revelando o conceito seguido: “Tinha que deixar de ser uma pura mostra de peças para ter uma leitura mais humanizada, dado o projeto em que estamos inseridos do Parque Biológico da Serra da Lousã e com a componente social do trabalho que desenvolvemos como Fundação junto de uma população com necessidades especiais”.
Trabalhando essencialmente com pessoas com necessidades especiais, a ADFP integra, desde início, utentes no projeto turístico.
É assim que surge o Espaço da Mente, um Eco-Museu Territorial, onde é possível fazer uma viagem pela história da Terra e do Homem e pela memória de Miranda do Corvo e do seu povo desde tempos imemoriáveis.
Face à necessidade de repensar o conceito, a instituição avança para a materialização de uma filosofia, a que deu o nome de Trivium.
“Ao mesmo tempo que começámos a construir o espaço, pensámos na forma de colocar as peças cá dentro. E há uma filosofia subjacente ao projeto em que as peças são a evidência material de toda essa filosofia”, sustenta Nancy Rodrigues, que passa a explicar: “A filosofia parte do princípio de que o Homem é corpo, mente e espírito. A espécie humana é uma espécie como outra qualquer, e a demonstração disso é o próprio Parque Biológico, e daí surge o projeto Trivium. Isto é, o corpo e a igualdade, ou seja, o Homem é igual na Natureza a qualquer outra espécie, e é representado pelo Parque Biológico; a mente e a liberdade, ou seja, a evolução da mente na espécie no primeiro hominídeo e a necessidade de se adaptar e de sobreviver nos contextos em que vivia faz com que desenvolva a mente e construa objetos e isso só é possível, efetivamente, com liberdade, não uma liberdade, mas várias liberdades, e é aqui que surge o Espaço da Mente; e, depois, o espírito e a fraternidade, ou seja, aquilo que está para além do corpo e da mente, e que será representado pelo Templo Ecuménico, que está em construção”.
Numa das paredes exteriores do edifício que alberga o Espaço da Mente pode ler-se: “A vida não começa connosco, continua através de nós”. Este é, no fundo, o lema do Trivium, que a ADFP corporiza com o Parque Biológico, que representa a igualdade da vida, o museu eco territorial, que é o Espaço da Mente, que invoca a liberdade, e ainda o Templo Universalista, onde todas as religiões conviverão, e que obriga à fraternidade com toda a Natureza.
De volta ao Espaço da Mente, Nancy Rodrigues nota que é “um museu que tem uma componente etnográfica e também uma base social, pois as três pessoas que servem de guia são pessoas com necessidades especiais”.
No Espaço da Mente o visitante dá um mergulho no tempo, desde o início da evolução do hominídeo, do Australopiteco ao Homo Sapiens, terminando com uma carreta de caixões. Afinal, onde todo o Homem termina!
A cronologia que acolhe os visitantes no corredor da entrada espelha a evolução dos cinco continentes e, “ao contrário de muitas que existem e são utilizadas em muitos museus e outros espaços culturais, é menos ocidentalizada”, sustenta Nancy Rodrigues, explicando: “A sucessão de factos e datas termina com uma cronologia mais pequena relativa a Portugal e que acaba com Coimbra – Património Mundial da Unesco. Então, depois, entramos num espaço denominado Miranda Terra Solidária, uma designação que Miranda do Corvo adotou por toda uma história que tem em prol da solidariedade e dos valores humanistas”.
Começa-se pela história dos cinco continentes e pela evolução da espécie humana, para depois, já na primeira sala do museu, se encontrar a história do concelho de Miranda do Corvo, desde os tempos dos romanos.
Uma homenagem ao Homo Habilis e às diferentes visões de liberdade que estão na base da civilização humanista.
Para a Fundação, o propósito é a recuperação e preservação de testemunhos materiais de outros tempos, essencialmente do século XX, marcos dos modos da vida e da identidade de uma população rural.
Lá está a «Triste vida», carrinho de mão utilizado pelos agricultores e que representava a dureza e as agruras da vida da população rural do sopé da Serra da Lousã. Lá está o asado, cerâmica de formas femininas que Miranda do Corvo deu ao Mundo.
A coleção reúne um valioso e diversificado espólio que permite mostrar peças representativas das artes e ofícios tradicionais, vivências diárias de outros tempos e a representação da ferrovia e da extinta JAE (Junta Autónoma das Estradas), elementos fundamentais no desenvolvimento de Miranda do Corvo e na sua ligação ao Mundo.
Lá está a representação da barbearia, com a tradicional cadeira e ainda uma outra para os mais pequenos. Lá está o consultório médico, com o mobiliário original de um dos dois consultórios do médico Altino Brinde e o aparelho de Raio-X, que Miranda do Corvo teve ainda antes de ser homologado pelas entidades competentes. Lá está a carreta de caixões e a evocação às doenças do século passado que tantas vidas ceifaram.
Ao longo do percurso no interior do museu, o visitante depara-se com referências a diversas liberdades, numa referência direta aos objetos expostos. A liberdade Política, a liberdade Inconsciente, a liberdade de domesticar, a liberdade de semear, a liberdade de inovar, a liberdade de Imprensa, a liberdade de Pensamento, a liberdade de Viajar, a liberdade de Religião… Note-se que é em liberdade que o Homem cria, inova e progride!
Para materializar toda a dimensão do Trivium já se ergue, no monte fronteiro ao Parque Biológico, uma estrutura piramidal, com base quadrangular, seguindo as proporções da razão de ouro (phi), e com uma altura de 13,40 metros, em analogia à altura do templo de Salomão.
Ali, e aproveitando a envolvente, a Fundação pretende criar um ambiente de harmonia com a Natureza e os céus, onde abundam os elementos persuasivos e estimulantes para o pensamento espiritual e reflexivo. Quer o templo, quer o espaço envolvente têm como objetivo ser um local eminentemente espiritual, funcionando como uma espécie de ponto de encontro de pessoas crentes ou não crentes.
Em cada uma das faces da pirâmide estará representada uma das três grandes religiões monotaístas: cristianismo, islamismo e judaísmo. A quarta face terá apenas três palavras simbólicas de espiritualidade.
É ainda intenção dos responsáveis pela instituição a criação de percursos pedonais filosóficos entre o Parque Biológico e o templo ecuménico, dedicados a pensamentos de génios imortais da sabedoria milenar.
Aliás, este é o conceito já experimentado na unidade hoteleira, o mais recente equipamento do complexo turístico da Fundação ADFP. Cada um dos 40 quartos do Hotel Parque Serra da Lousã tem o nome de um deus da mitologia greco-romana, tendo no seu interior um quadro dos mesmos e uma breve explicação sobre eles. Em jeito de curiosidade, o bar do hotel está entregue ao grego Dionísio.
Nunca perdendo de vista a sua essência, a ADFP construiu um hotel em que os quartos do piso térreo estão preparados para receber hóspedes com dificuldades de mobilidade, ao passo que toda a informação constante nas placas indicativas está também em braile.
Com classificação de 4 estrelas, o hotel tem 40 quartos (29 twins, oito duplos e três suites, em que nove têm as comodidades necessárias para pessoas com mobilidade condicionada), um restaurante, uma sala para reuniões, uma sala de leitura, uma piscina interior, um spa com massagens, sauna, jacuzzi, banho turco e ginásio, um campo de ténis e um campo de squash. Para além de toda a oferta de natureza e etnográfica, o parque de lazer público tem um campo de areia, um mini-campo de relva sintética e um pequeno circuito de manutenção com acesso a piscina exterior e parque infantil.
A funcionar desde Outubro, mas apenas inaugurado oficialmente no dia 8 de novembro último, o hotel tem registado uma taxa de ocupação média de 50%, o que os responsáveis consideram satisfatório, tendo em conta a época baixa.
Aliás, a Fundação ADFP, que já recebe a visita de muitas IPSS de todo o País, pretende aproveitar a época baixa para promover condições especiais às instituições que pretendam usufruir das instalações do hotel. Preços especiais para IPSS num ambiente de harmonia com a Natureza e onde não faltam coisas para ver e conhecer.
O convite é claro: “Adormeça ao som da brama e do chilrear das aves”.
Refira-se que no mesmo espaço, a Quinta da Paiva, o visitante pode agora pernoitar num hotel de 4 estrelas, desfrutar de uma série de atividades ao ar livre, visitar o Parque Biológico da Serra da Lousã, o museu eco territorial, o museu vivo de Artes e Ofícios Tradicionais com oficinas de artesanato e loja de venda, o Museu da Tanoaria e o deliciar-se no restaurante Museu da Chanfana.
Para pernoitar ou não, uma visita à Quinta da Paiva, em Miranda do Corvo, é algo que irá enriquecer quem lá for, seja pelo contacto com a Natureza, seja pelo conhecimento etnográfico, seja dentro em breve pela reflexão mais espiritual, mas sobretudo porque está a apoiar uma instituição que não esquece aqueles para quem nasceu, ou seja, pessoas vítimas de exclusão e as pessoas com necessidades especiais.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)

 

Data de introdução: 2015-12-11



















editorial

NOVO CICLO E SECTOR SOCIAL SOLIDÁRIO

Pode não ser perfeito, mas nunca se encontrou nem certamente se encontrará melhor sistema do que aquele que dá a todas as cidadãs e a todos os cidadãos a oportunidade de se pronunciarem sobre o que querem para o seu próprio país e...

Não há inqueritos válidos.

opinião

PAULO PEDROSO, SOCIÓLOGO, EX-MINISTRO DO TRABALHO E SOLIDARIEDADE

Em que estamos a falhar?
Evito fazer análise política nesta coluna, que entendo ser um espaço desenhado para a discussão de políticas públicas. Mas não há como contornar o...

opinião

EUGÉNIO FONSECA

Criação de trabalho digno: um grande desafio à próxima legislatura
Enquanto escrevo este texto, está a decorrer o ato eleitoral. Como é óbvio, não sei qual o partido vencedor, nem quem assumirá o governo da nação e os...