As relações entre gerações

As relações entre gerações são um dos principais factores que determinam o grau de coesão de qualquer sociedade e no caso da sociedade europeia toma contornos específicos devido à característica que se acentuou nos últimos anos que é o envelhecimento da sua população.
Importa referir que as relações de que se fala são consideradas sob diversos ângulos: económico, social, cultural, político, etc ...

Uma constatação preliminar que podemos fazer é de que cabe aos países europeus definir e executar aquilo que se poderá chamar de uma "política das idades da vida", isto é, já não são suficientes acções pontuais, fragmentárias e compartimentadas, mas sim uma estratégia de conjunto, global e sistémica que vise favorecer, ao longo do tempo, o entendimento e a solidariedade entre as gerações cada vez mais numerosas que coexistem lado a lado no interior dos países, pois é cada vez mais frequente a coexistência já não de duas gerações mas sim de três e mesmo quatro gerações (toma-se por geração um período médio de vinte anos).

Embora sejam reconhecidas iniciativas inovadoras e prometedoras levadas a cabo ou iniciadas pelo Conselho Europeu, Parlamento Europeu e Comissão Europeia foram cometidas inúmeras faltas, esquecimentos ou erros na tomada em conta antecipadamente de uma realidade actual em que coexistem várias gerações.
Preocupados com esta situação os conselheiros do Comité Económico e Social Europeu decidiram elaborar um parecer de iniciativa sobre esta temática, a qual considero oportuna e de grande importância actual e futura e decidi elaborar um resumo para partilhar com os leitores as posições que foram aprovadas e que a seguir cito:
Citação:
" São numerosos os domínios em que as carências de adaptação entre gerações se verificaram, dos quais se evocam alguns:
- o financiamento das reformas
- as posições e os contributos respectivos que os elementos do pessoal pertencente às diversas faixas etárias tem no funcionamento das empresas e das administrações (para resolver as questões de efectivos e de aligeiramento dos custos de exploração foram adoptadas disposições avulsas sem que se tivesse preocupação com os "danos colateriais".
- formação contínua
- Urbanismo; alojamento e localização dos equipamentos colectivos e comerciais (são ignoradas as necessidades específicas dos mais jovens, dos idosos e das famílias.
- Transmissão dos patrimónios materiais (os dispositivos jurídicos e fiscais não foram revistos e adaptados em função da evolução demográfica)
- Relações entre o universo da educação e o universo do trabalho (atraso na maioria dos países da EU)
- Conservação, valorização, exploração e colocação em comum do acervo de experiência e de memória (risco de desperdício de conhecimentos, capacidades, experiência e memória)
- As Culturas (não se distinguiu suficientemente o que decorria da moda do que decorria de invenções de progresso duradouras; deixou-se que se desenvolvessem fenómenos de amnésia, de desprezo, de receio, de remorso e portanto compartimentação entre gerações)
Identificadas as carências que referimos passamos às orientações e recomendações as quais devido à sua complexidade, dado o seu campo ser muito vasto, numa primeira abordagem não é possível fazer mais do que um inventário e sem ordem de prioridade.
No campo das orientações são as seguintes, que passo a citar:

- Extensão, peso e limites dos papéis e das responsabilidades que no futuro incumbirão às famílias, na organização societal: crianças, adultos; pais e avós.
- Acesso das mulheres ao mercado de trabalho e equipamentos colectivos de acolhimento para a infância.
- A solidão e o isolamento nas sociedades europeias: pessoas de idade, jovens desfavorecidos, ’infância pobre’
- Contratos geracionais e solidariedade intergeracional: como organizar social e politicamente arbitragens satisfatórias - isto é, respeitadoras do futuro - tendo em conta as limitações e pressões actuais e o silêncio de outros.
- Escolhas em matérias de urbanismo, de alojamento e relações entre gerações: as concepções e as escolhas nestas matérias adoptadas nestes últimos anos revelam ter frequentemente esquecido a emergência de importantes necessidades por parte das diversas gerações que colocam problemas de tipo:
· Desenvolvimento da autonomia residencial das pessoas de idade e das suas relações com as gerações mais novas, com a infância e a adolescência.
· Coabitação forçada de adultos ainda jovens e celibatários (estudantes, jovens trabalhadores) em alojamentos familiares não concebidos para esse fim.
· Acolhimento, que não seja segregador e temporário, das famílias consideradas ’difíceis.
- Que papéis úteis pode e deve a ’democracia participativa’ exercer na organização das relações entre gerações ?

Em sequência o Comité decidiu evocar como recomendações três aspectos, que são os seguintes:

1) A duração da vida activa: debruçar-se sobre os desafios colocados pelo envelhecimento, de há muito previsto, das suas populações. O encurtamento das carreiras profissionais cria uma perda de potencial económico, social e cultural. Existem já definidos meios para inverter a tendência e são bem conhecidos, tais como:
- assegurar melhor a empregabilidade dos trabalhadores menos jovens mediante aperfeiçoamento da formação contínua.
- melhorar a qualidade dos postos de trabalho e aumentar a flexibilidade de horários, de modo a assegurar um melhor equilíbrio entre tempo de trabalho e vida pessoal, desenvolver nas empresas equipas de ’idades mistas’
- infundir mais confiança em si próprios aos trabalhadores mais idosos
- reforçar as medidas de protecção à saúde
- assegurar de maneira contínua uma melhor planificação das carreiras
- adoptar incentivos em matérias de reforma e de fiscalidade, etc.

2) Os decisores políticos nos Estados Membros devem assegurar uma maior concordância entre o "dizer" e o "fazer" e tal deveria conduzi-los a:
- a identificar correctamente, nos sistemas jurídicos ou contratuais em vigor nos respectivos países, as disposições que, explícita ou implicitamente contrariam o prolongamento voluntário da vida activa.
- a seguir, mais e melhor do que hoje em dia fazem, as boas recomendações da Comissão e a aplicar as directivas mais rapidamente
- a levar a cabo acções de informação, de incentivo e de persuasão junto dos decisores políticos e parceiros económicos e sociais, bem como proporcionar uma melhor comunicação com os ’média’ dos seus respectivos países.

3) Reequilibrar as estruturas etárias na Europa: o problema da queda da fecundidade e da natalidade, uma insuficiente renovação de gerações, que os contributos da imigração não compensarão e que não deixará de provocar uma contracção do lugar da Europa no mundo, e no interior da Europa provocando dificuldades económicas e financeiras e bem como indesejáveis riscos de fracturas e de conflitos entre gerações.
Fim de citação".

Em conclusão trata-se da elaboração progressiva de um novo pacto entre gerações nos territórios da União Europeia.
Este é um tema que tem a ver muito com o futuro da Europa e dos europeus e necessitaria de muito empenho e determinação dos nossos políticos em estudar a antecipação das necessidades futuras neste domínio, identificar as medidas para solucionar o problema e implementar essas medidas com eficácia.
Infelizmente não creio que os nossos políticos ministeriáveis tenham essa capacidade, a governação dos últimos dez anos foi muito medíocre e assiste-se agora na elaboração das listas ao festival do amiguismo e tráfico de influências que conduzem à incompetência. É necessário que a classe política coloque os interesses do país muito à frente dos seus interesses pessoais e que se disponibilizem para uma ’cultura de serviço ao país’
A continuar assim Portugal torna-se ingovernável. O que nos resta ? talvez tornarmo-nos numa região de Espanha ?.

* Economista. Representante da CNIS no Comité Económico e Social Europeu

 

Data de introdução: 2005-02-22



















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