VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Mais de 13 mil crianças vítimas silenciosas de um crime que lhes pode condenar o futuro

Mais de 13 mil crianças assistiram no ano passado a actos de violência entre os pais. São testemunhas silenciosas de um crime que lhes pode condenar o futuro: em adultos transformam-se muitas vezes em agressores ou vítimas, repetindo o que viram na infância. Em quase metade dos casos de violência doméstica participados às autoridades no ano passado estava presente, pelo menos, um menor. As contas apontam para mais de 13 800 crianças e jovens, mas a investigadora Ana Sani lembra que os números da violência doméstica são apenas "indicadores" de uma realidade mais dramática. "Se não se conhece ao certo quantas são as vítimas, muito mais difícil é saber quantas são as crianças que assistem".

A observação destes episódios deixa marcas graves e pode replicar o fenómeno: "Há um processo de aprendizagem em que se identificam com uma das figuras parentais, tornando-se mais tarde vítimas ou agressores. Normalmente verifica-se uma transferência de geração para geração", explica Helena Sampaio, psicóloga da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV).

"Estar exposto à violência dentro de casa, envolvendo os próprios pais, é muito diferente de estar exposto à violência na comunidade", sublinha Ana Sani, investigadora da Universidade Fernando Pessoa.

"Há crianças que se metem entre os pais para tentar acabar com a violência", diz, acrescentando que "muitas assistem com regularidade à vítima a precisar de cuidados hospitalares". No ano passado, as forças de segurança receberam 30 543 queixas de violência doméstica.

A maioria destas crianças acaba por viver o drama familiar em silêncio, escondendo o crime por vergonha. Outras são forçadas ao silêncio pelo agressor ou vítima, sublinha a psicóloga. No entanto, alertam as especialistas, os sinais estão lá e é preciso estar atento. Na escola, essas crianças tendem a ter problemas de relacionamento: umas tornam-se mais reservadas, outras mais agressivas. O fraco rendimento escolar ou o absentismo são indícios que também não devem ser ignorados.

"Muitas vezes não querem estar na escola porque sentem que se estiverem em casa a agressão será menor. O que pode parecer fobia escolar muitas vezes é ausência de concentração, porque os pensamentos estão em casa", conta Ana Sani.

Não existe um comportamento padrão, tal como as histórias são diferentes. Ana Sani sublinha o papel crucial dos professores, por serem "muitas vezes as primeiras pessoas que acompanham diariamente as crianças ao longo dos anos".

Por as crianças não serem o alvo das agressões, muitos pais estão longe de perceber os efeitos nocivos para elas. "Muitas vezes, temos de lhes mostrar que o que se passa é prejudicial para as suas crianças", contou a técnica da APAV Helena Sampaio à Lusa.

Quase metade das vítimas femininas que recorreram à APAV tem filhos (47 por cento) e quase todas vivem com o sentimento "de terem falhado como mães e mulheres".

Mas existem casos mais graves de mulheres que "perdem a paciência para as crianças, acabando por tratá-las mal: as mulheres são vítimas do marido e agressoras em relação às crianças", acrescentou.

 

Data de introdução: 2010-04-28



















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