CÁRITAS PAROQUIAL DE SINES

Os pais são pouco participativos e, muitas vezes, erradamente exigentes

Foi o boom populacional que Sines sofreu na década de 70 do século passado, com a criação do complexo industrial, que a cidade do litoral alentejano começou a sentir a carência de respostas sociais, em especial dedicadas à área da infância.
“Na altura, Sines era muito pequena, tinha uma população que não chegava às cinco mil pessoas, mas com o advento do complexo industrial, na década de 1970, vieram para aqui 40 ou 50 mil pessoas e havia várias carências de âmbito social, uma delas era respostas para os funcionários deixarem os filhos”, explica António Brás, tesoureiro da Cáritas Paroquial de Sines, instituição criada, então, por um grupo de pessoas ligadas, na altura, à CNP, depois Petrogal, e que, como católicos que eram, acabaram por entregar a resposta à Igreja, em 1981.
O Gabinete da Área de Sines cedeu um terreno, onde hoje se ergue o equipamento social, que na altura tinha uns pré-fabricados, onde o infantário funcionou até há 15 anos.
Com o infantário nas mãos, a Igreja avançou para a criação da Cáritas Paroquial de Sines, que tem desenvolvido, essencialmente, respostas na área da primeira infância.
“O que sentimos, claramente, é que a primeira infância tem algumas peculiaridades. Para já, Sines tem estado sempre entre as três, quatro primeiras localidades com maior rendimento per capita e tem uma outra coisa que a torna distinta do contexto em que está e que o último Censos já mostrava: não aumentou a população, mas o que perdeu foi apenas um número residual de pessoas. E não aumentou de população, porque Sines está a mandar dezenas de casais jovens para Santo André, porque aqui não há habitação”, revela António Brás, sublinhando que, “neste momento, a falta de habitação é o maior problema social de Sines”.
E porque sente esse problema, como, no âmbito do PRR, as instituições podem construir habitação para arrendamento acessível, a Cáritas de Sines “não exclui essa possibilidade”, mas é algo que necessita de ponderação “em termos da estrutura da instituição”.
“Sines tem uma população muito jovem e tem atraído muitos jovens para a região, mas que não têm habitação na cidade. No entanto, trabalham em Sines e é aqui que deixam os filhos. Sob esse ponto de vista, não temos razão de queixa, porque temos muita procura”, argumenta, esclarecendo: “Há muitos anos que não há um ano em que não tenhamos o dobro de inscrições para as vagas disponíveis, e esta Direção, liderada pela Irmã Conceição, está já há 15 anos em funções”.
Para António Brás, algumas medidas adotadas pela instituição de forma pioneira em Sines, granjeou-lhe alguma vantagem.
“Adotámos algumas decisões estratégicas que se revelaram importantes, desde logo, o horário, abrindo muito mais cedo do que os outros infantários. Há muito que começámos a abrir às 7h30, porque sabíamos que muitos pais começavam nas fábricas às 8h00… Isso foi uma vantagem e, depois, percecionámos uma questão importante que era a saída, que passou a ser às 20h00, 20h30, porque os pais saiam das fábricas por essas horas”, argumenta, revelando ainda a introdução de atividades extracurriculares, “com o critério de que nenhuma atividade fosse paga, e ainda hoje não é”.
Com 100 bebés distribuídos por sete salas de creche, 85 petizes por quatro salas de pré-escolar e uma equipa de 40 funcionários, o infantário «O Pintainho» vive, atualmente, um momento de “contas equilibradas”.
“O nosso volume de receitas e despesas é grande, mas raramente temos resultados negativos, apenas quando temos despesas extraordinárias. Temos conseguido chegar ao final do ano com resultados positivos e, por isso, temos as contas equilibradas”, sustenta, ressalvando que a instituição tinha “algumas ameaças identificadas, como a quebra de rendimento dos pais e a questão dos juros bancários, mas hoje já não tem grande impacto”.
Para António Brás, a Cáritas de Sines poderá ter como “vantagem, em relação ao distrito, o poder de compra”, pelo que “diria que a instituição tem um bom nível de mensalidades”.
Neste sentido, a implementação da Creche Feliz teve algum impacto negativo nas contas da instituição, apesar de não ser nada de significativo.
“Tínhamos um nível médio de mensalidades um pouco superior ao que agora recebemos do Estado. Não perdemos muito, mas vamos perder qualquer coisa. O que vamos perder é residual e, nos últimos 10 anos, devem ter sido duas, três pessoas que ficaram a dever mensalidades. Não tenho uma explicação objetiva para isto, talvez pelo facto de as pessoas terem algum poder de compra”, sugere.
De momento, para além do infantário «O Pintainho», a Cáritas de Sines distribui alimentos do Banco Alimentar Contra a Fome e iniciou um projeto, ainda em fase de desenvolvimento e já com “um sucesso interessante” e a que a instituição chama «As Visitadoras», “que é algo semelhante aos Anjos da Noite”.
“São pessoas ligadas à Igreja e que, em regime de voluntariado, vão passar a noite a casa de idosos que estão sozinhos. Tem sido um projeto importante, porque se baseia muito na confiança. Este projeto de acompanhamento noturno chamado «As Visitadoras», porque é aquele problema que identificamos cada vez mais, que é a solidão”, explica o tesoureiro da Cáritas, que identifica uma lacuna grave no concelho: “Há um problema gravíssimo em Sines que é não haver uma unidade de cuidados continuados, o que é dramático para as famílias e para os próprios idosos. O nosso projeto tenta atenuar isto um pouco, em puro voluntariado. Temos tentado é que estas pessoas não olhem para os voluntários como alguém que está ali para lhes ir às compras, à farmácia, etc.. Se assim for, estamos a institucionalizá-las em casa. A ideia é recuperar aquele espírito de vizinhança antigo, de quando a vizinha ficava viúva a outra ia lá passar umas noites”.
Já sobre o apoio alimentar que a instituição presta a cerca de 200 famílias, em Sines e Porto Covo, gera perplexidade a António Brás: “Não acredito que haja 200 famílias com necessidades em Sines. Agora, não sei se não declaram tudo o que recebem, se é a triagem que não está bem feita, mas não sei avaliar. Depois, há pessoas que têm as prioridades invertidas, porque aparecem aqui em bons carros, mas depois vivem em casas de terceiro mundo. E Sines tem muito esta tendência, primeiro era a pesca e agora com as paragens das fábricas, que dão bom dinheiro, mas não dão sempre”.
Questionado sobre qual a maior dificuldade que a Cáritas sente para levar em frente a sua missão, António Brás aponta, enquanto instituição, “a falta de voluntariado para dirigentes” e, no infantário, “o grande problema é o baixo espírito crítico das famílias, a pouca exigência dos pais, que deviam ser muito mais exigentes”.
“Os pais são pouco participativos e erradamente exigentes… Não é natural que uma criança de cinco ou seis anos saia daqui a ler e a escrever ou a falar inglês! É contraproducente. Depois, notamos que há pouco espírito crítico, há uma preocupação grande com o sucesso dos filhos e exigência que não é prioritária. Nesta fase, o importante é as crianças interagirem umas com as outras, ganharem espírito de grupo, serem autónomas, etc.. E temos falado com outras instituições, não apenas sociais, mas de música e outras, e vivem a mesma coisa. Está tudo com muita pressa na nossa sociedade”, justifica e dá um exemplo: “Quando criámos este espaço exterior, opcionalmente não colocámos brinquedos, porque queremos que as crianças criem as suas brincadeiras. Já os pais queriam muitos brinquedos, até queriam oferecer. Depois, há pais que têm uma exigência grande connosco, mas, no verão, que já só fechamos uma semana para facilitar a vida aos pais, mas depois chegam aqui de toalha ao pescoço, deixam o filho e vão para a praia”.
Ainda sobre a Creche Feliz e os seus critérios de admissão, António Brás vê virtudes, mas também um problema: “A creche gratuita tem coisas boas, mas também acarreta uma perda de autonomia de quem está no terreno. O que é válido para Sines, não é válido para o Seixal. Sines tem estas flutuações na questão do emprego e sempre tentámos dar prioridade aos pais que trabalham. Isto agora mudou. Ainda nos estamos a adaptar, porque cada terra tem as suas especificidades e, com isto, perdemos alguma autonomia, alguma capacidade de decisão em algumas questões concretas que depois podem não ser justas”.
E como seria Sines sem o infantário «O Pintainho»?
“Era dramático, porque não há muitas respostas em Sines”, afirma António Brás, acrescentando: “Estão aqui 200 crianças, que, atualmente, não teriam resposta. Havia pais que tinham que ficar em casa com as crianças. No Pré-Escolar a autarquia conseguiria absorver os miúdos, mas na creche era complicado”.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)

 

Data de introdução: 2024-01-16



















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