OPERAÇÃO NARIZ VERMELHO, LISBOA

Doutores Palhaços receitam alegria às crianças hospitalizadas

“Esta história começa numa ida ao hospital, depois de muito tempo de espera, a fazer telefonemas e a tentar ser atendida, já cansada e desesperada. Olho e reparo num palhaço: telemóvel gigante, sapatos enormes, uma pele escura que sobressaía debaixo do rosto pintado, um nariz vermelho sobre uns olhos negros e que repete todos os meus movimentos. Gesticula, anda impacientemente e conversa exaltadamente.
Perante o absurdo da situação, ele atinge o seu objectivo: faz-me rir, a mim e à minha filha. O seu tratamento acalma-nos, prepara-nos para mais algum tempo de espera e principalmente parece nos tornar visíveis aos nossos olhos. Afinal, o nosso doutor é especial. Nunca mais esqueci o meu Dr. Chocolate, especializado em palhaçadas.
Obrigada Dr. Chocapic!

Cristina Coelho, uma paciente sua…”


Diz o ditado popular que rir é o melhor remédio e são receitas de alegria e boa disposição que os “Doutores Palhaços” levam às crianças internadas em 11 hospitais espalhados pelo país. A equipa é, actualmente, formada por 21 profissionais da gargalhada que desde 2002 já visitaram quase 200 mil crianças.
A Operação Nariz Vermelho foi oficialmente constituída em 2002 como instituição particular de solidariedade social. Foi o resultado de um longo processo iniciado por Beatriz Quintella, actual presidente, que em 1993 leu um artigo que relatava o trabalho dos Doutores Palhaços que visitavam crianças hospitalizadas nos Estados Unidos. Não havia nada parecido em Portugal e Beatriz ofereceu-se ao Hospital D. Estefânia, em Lisboa, para levar a sua personagem de palhaço aos meninos internados. Trabalhou sozinha durante oito anos e sempre como voluntária.

À medida que começava a trabalhar em outras pediatrias, visitou dois projectos estrangeiros: o projecto fundador da ideia do Dr. Palhaço, o Big Apple Circus, em Nova Iorque e os Doutores da Alegria, no Brasil.
Em Setembro de 2001 Beatriz convidou dois amigos, Bárbara e Mark Mekelburg, para ajudarem na criação do programa e graças a uma contribuição de uma empresa privada, o projecto assumiu um carácter profissional, estabelecendo-se nos hospitais de Santa Maria, Instituto Português de Oncologia e D. Estefânia, em Lisboa.
Mark Mekelburg, vice-presidente da instituição, foi o anfitrião desta reportagem. O Dr. Pipoca, nome artístico, explicou ao Solidariedade que de início a ideia de ter palhaços a circular pelas enfermarias pediátricas dos hospitais causava desconfiança na comunidade médica e nas próprias famílias. “Para fazer ideia, quando a ideia surgiu em Nova Iorque, um médico virou-se para o Doutor Palhaço e disse-lhe que o hospital não era lugar para palhaços, ao que o Palhaço respondeu: «Concordo consigo, mas o hospital também não é sítio para as crianças»”, conta o responsável.

Os artistas têm formação especializada no meio hospitalar e trabalham em estreita colaboração com os médicos e enfermeiros. As actuações são adaptadas a cada criança e a cada situação. “Todos os nossos «Doutores» são profissionais renumerados e em formação contínua para que os níveis de qualidade sejam mantidos”. O trabalho é, regra geral, desenvolvido em duplas e antes de entrarem na enfermaria, os Doutores Palhaços falam com as enfermeiras para se inteirarem do estado de saúde de cada doente. “É impossível mantermos o mesmo ritmo durante o dia todo, por isso exageramos um pouco aquilo que somos. A mesma dupla trabalha junta durante cerca de três meses e a muitas coisas acontecem de improviso. A maioria das vezes corre bem, outras nem por isso”, explica o Dr. Pipoca (Mark Mekelburg).

Para além das visitas nos hospitais, a instituição desenvolveu um centro de estudos, que organiza workshops dirigidos a públicos variados, desde pessoas individuais, a empresas, profissionais de saúde, etc. A ideia é partilhar os efeitos positivos do bom humor. “Está provado cientificamente os benefícios físicos do riso e o pessoal médico começa a dar valor a isso”, sublinha o dirigente e adianta que a instituição vai desenvolver em parceria com uma equipa da Universidade do Minho uma metodologia que pretende estudar e criar indicadores para medir o resultado da intervenção do palhaço no hospital. “A inovação deste projecto reside no facto desta organização se propor a avaliar o impacto efectivo do seu trabalho e responder se rir é realmente o melhor remédio”. O projecto, cotado na Bolsa de Valores Sociais, pretende investigar o impacto da intervenção do Palhaço de Hospital junto das crianças internadas, analisando os efeitos físicos, emocionais e psicológicos. O Hospital de São Marcos, em Braga, vai servir de observatório para o estudo.

A Operação Nariz Vermelho não se dirige apenas às crianças hospitalizadas, mas também às famílias e profissionais de saúde. De bata branca, nariz vermelho e assobio sempre pronto, os Doutores Palhaços visitam todos os quartos, onde brincam também com os enfermeiros, médicos e auxiliares. No final, todos se riem das piadas. “Mesmo para os pais das crianças acaba por ser um momento de escape, porque esquecem, por segundos, a razão pela qual estão aqui”, diz o Dr. Pipoca.

A instituição recebe muitos pedidos para visitar unidades de saúde, mas o trabalho está dependente da angariação de fundos, além de que não querem crescer sem “supervisionar a qualidade” das “consultas”. Quando questionado sobre os critérios de selecção dos Doutores Palhaços, Mark aponta como essencial a formação corporal, musical, boa projecção de voz, equilíbrio vocal, ritmo, mímica, técnicas de circo e um “grande coração”. “No hospital muitas vezes não recebemos palmas, nem sorrisos, nem risos e é necessário estar preparado para dar sem receber nada em troca”.

Normalmente, são as crianças mais novas as que acham mais graça a estes doutores de nariz vermelho, mas, por vezes, o trabalho também é desenvolvido com adolescentes. “Temos crianças que, infelizmente, passam muito tempo no hospital, nós acompanhamos esse crescimento e mantemos o contacto com jovens que já riram com o palhaço, enquanto crianças”. Mark Mekelburg garante que todo o trabalho desenvolvido tem ido “muito além de qualquer expectativa” inicial e classifica-o como uma “viagem fantástica” em termos artísticos e humanos.
Só em 2009, a equipa de Doutores Palhaços visitou cerca de 34 mil crianças e deu 713 “consultas” nos 11 hospitais onde trabalham. Objectivo principal: receitar alegria!

Texto: Milene Câmara

 

Data de introdução: 2010-10-09



















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