PROTOCOLO DE COOPERAÇÃO

Uma proposta comum para potenciar poder negocial

Está agendada para a primeira quinzena de fevereiro a primeira ronda de negociações entre as organizações do Setor Social Solidário e o Governo tendo em vista a assinatura de um renovado Protocolo de Cooperação, que deverá ter novamente a vigência de dois anos.
A grande novidade da negociação de 2017 é que as três organizações do Setor Social Solidário – CNIS, União das Misericórdias Portuguesas e União das Mutualidades Portuguesas –, após articularem posições e preocupações, decidiram apresentar ao Governo uma proposta comum. Apesar de algum histórico de concertação de posições, esta é a primeira vez que o Setor Social Solidário se apresenta a negociar com o Estado como um bloco.
“As três organizações representativas do Setor Social Solidário já vêm articulando as suas posições e estudando os dossiês, mas agora julgámos oportuno, até por ser mais fácil para o desenvolvimento do diálogo com o Governo, apresentar uma proposta comum dos pontos mais importantes a abordar no Protocolo e das necessidades mais prementes às quais convém em, sede de cooperação, dar resposta”, começa por dizer o presidente da CNIS, que acrescenta: “Esta iniciativa é importante, aliás, já vinha sendo ensaiada e vai ser, certamente, replicada no futuro, não apenas em relação ao Compromisso de Cooperação, como em outras iniciativas”.
O líder da CNIS lembra que os pontos que unem as três organizações são muitos: “Estamos todos no mesmo Setor, enfrentamos os mesmos desafios, estamos todos irmanados na mesma vontade de responder aos desafios e de encontrar as melhores soluções e, por isso, articulando, partilhando conhecimento estamos no bom caminho”.
Unidas em torno de uma única proposta, as três organizações esperam não apenas fortalecer o seu poder negocial, mas de certa forma facilitar o próprio processo negocial que este mês se inicia.
“Terá um poder negocial mais forte e estará também mais facilitada a negociação. Até para o próprio Governo será melhor estarmos todos a abordar as mesmas questões do que uns a abordar uns assuntos e os outros outros. De facto, é tudo comum, estamos todos confrontados com os mesmos desafios, com os mesmos problemas, pelo que concertar caminhos e vias de solução é o melhor. E repito, para o próprio Governo será mais fácil e assim se poderá acelerar mais a negociação, porque há um trabalho de base entre as três organizações, que apresentam uma proposta comum, e assim é apenas perante uma proposta que se irá refletir. Penso que é um melhor caminho”, argumenta o padre Lino Maia, sublinhando o que de positivo tem esta posição.
Esta concertação de esforços, que se reflete na proposta comum, dá mostras igualmente da união e da força do Setor Social Solidário em tempos de alguma incerteza. Se, por um lado, surgem intenções de aglutinar as organizações da Economia Social numa superestrutura, com todos os perigos da diluição do setor que isso acarreta, por outro, sabe-se da fragilidade da maioria parlamentar que suporta o Governo e da «desconfiança» que alguns dos partidos que o suportam têm face ao setor.
“Em relação à Economia Social, é bom que este Setor apresente uma voz audível, credível, concertada e que mostre que, de facto, há comunhão e unidade no Setor Solidário. Quando digo que este Setor não se pode diluir no global da Economia Social, estou também a dizer que é importante que marquemos a diferença pela positiva e pela nossa especificidade. Esta é também uma forma de o fazermos”, aponta o líder da CNIS, acrescentando: “Divididos nunca estivemos e este esforço de concertação, de diálogo, de comunhão já tem um percurso feito com resultados muito positivos. Agora, no fundo, isto vem consagrar este esforço, dar-lhe visibilidade e mesmo para os vários partidos políticos e para a sociedade assim aparecemos mais fortes e mais coesos, o que é importante”.
Para o dirigente máximo da CNIS chegar a um entendimento entre as três organizações do Setor Social Solidário não foi difícil, pois os anseios são semelhantes, tal como as preocupações e as dificuldades, salvaguardadas as devidas diferenças.
“Foi muito fácil chegarmos a entendimento, pois, como disse, é um caminho que já vem sendo ensaiado e com resultados positivos. Apesar das especificidades de cada um – as mutualidades e as misericórdias têm-nas, tal como o grosso das IPSS é muito plural –, no fundo, os desafios são os mesmos e a preocupação também, que é servir e cooperar”, explica, reforçando a ideia: “Repito, servir e cooperar é a preocupação que temos e o que nos anima, por isso foi fácil, está a ser fácil. Não há uma entidade que represente estas três organizações, elas continuam a ter a sua autonomia e bem identificada, mas pode ser que no futuro até haja uma forma de consagrar esta comunhão que existe entre elas. Não vamos precipitar os acontecimentos, vamos continuar a aprofundar este diálogo. Não vamos começar a casa pelo teto, vamos caminhando porque penso que estamos a caminhar bem”.
Sem querer revelar o conteúdo da proposta a entregar ao Governo sem antes lha transmitirem de viva voz, o padre Lino Maia refere algumas das preocupações que conduziram as três organizações à elaboração da mesma.
“Não quero partilhar muito aquilo sobre o que vamos falar com o Governo antes reunirmos e gostava que a proposta quando viesse a público fosse já numa fase em que, mesmo que ainda não estivesse acertada a negociação, o senhor ministro já conheça a proposta que lhe vamos apresentar presencialmente”, salvaguarda, adiantando, no entanto, algumas questões que estarão em cima da mesa.
“Há um problema concreto que tem que ver com os custos dos serviços que prestamos e que têm vindo a crescer e é preciso responder a isso. O Estado é corresponsável pela sustentabilidade das instituições. Este é um assunto importante e vamos ver como é que vamos resolver esta questão”, começa por especificar, acrescentando: “É também necessário dar uma atenção importante a certas coisas que se passam nas nossas instituições. Isto é, cada vez os nossos utentes, em especial na área dois idosos, são mais dependentes. E é importante que haja uma atenção especial a isto. Depois, o País não é igual e é importante que haja uma atenção à diferenciação das situações, acautelando sempre a sustentabilidade das instituições”.
O presidente da CNIS lembra que “há outros assuntos a abordar e mesmos estes têm que ser aprofundados com o Governo” para que se consiga não “um resultado ideal, mas o possível”.
Neste contexto e, por certo, preocupação maior para muitas instituições, as repercussões do aumento do salário mínimo para 557 euros serão igualmente alvo de atenção na negociação do presente Protocolo de Cooperação.
“Tenho notado da parte do Governo sensibilidade para esta questão e que vai de encontro ao que venho dizendo há muito. O Estado é corresponsável na sustentabilidade das instituições. O que as IPSS fazem é serviço público, que o Estado valoriza e comparticipa para que seja prestado”, começa por afirmar o presidente da CNIS, que salienta os elevados custos que as IPSS têm com as remunerações.
“A massa salarial nas instituições é muito forte, bastante mais de 50% das despesas das instituições são com salários, pelo que qualquer mexida nas remunerações tem um impacto muito grande. Se na economia em geral os custos com salários anda entre os 13 e 15%, no nosso Setor ultrapassa largamente os 50% e há muitas instituições, nomeadamente as mais voltadas para o apoio a pessoas com deficiência e a pessoas idosas, em que chega aos 70%”, revela, mostrando-se convicto que do lado do Estado há consciência desta situação: “Estou convencido, porque tenho visto sinais do Governo, o próprio primeiro-ministro já disse estar atento à situação, que vamos encontrar uma resposta que não será a necessária, mas a possível, porque sei que os recursos são finitos. E cada vez mais a sociedade, porque envelhecemos mais, necessita de mais apoios e não se está a criar riqueza suficiente para a prestação destes apoios. Há que ter isto em atenção, provavelmente há caminho que ainda não se percorreu e que é importante percorrer para que não cresçam demasiado os custos e cresça, sim, a qualidade dos serviços. É uma matemática um bocado difícil, mas se continuarmos a apostar na moderação, no bom senso, e se alguns serviços do Estado abandonarem aquela prática persecutória em relação às instituições, penso que vamos conseguir algo positivo”.
Por altura da revogação, em sede de Assembleia da República, do Decreto-lei que reduzia a Taxa Social Única a pagar pelos empregadores em 1,25%, na sequência do acordo na Concertação Social, o líder da CNIS já tinha afirmado que o aumento do valor dos Acordos de Cooperação terá que ser “bastante superior à inflação”.
“Até porque a inflação, em Portugal, no ano passado está estimada em 0,6%, mas nas IPSS, exatamente porque tem grande importância a massa salarial, a inflação é muito superior”, disse na altura o padre Lino Maia, ressalvando, pois “é importante que não restem dúvidas”, que “a CNIS é a favor do aumento do salário mínimo nacional”.
Para melhor perceber o impacto deste aumento nas IPSS, a CNIS levou a cabo um estudo que irá a breve trecho apresentar ao Governo.
Ciente da sensibilidade dos governantes para a situação, o padre Lino Maia diz-se moderadamente otimista.
“Tenho um otimismo moderado. Nenhum de nós vai dizer que conseguiu o ideal, mas dando as mãos e sabendo das dificuldades vamos procurar responder”.
Recorde-se que o último Protocolo de Cooperação entre o Setor Social Solidário e o Estado foi assinado em dezembro de 2014, com o Governo liderado pelo primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, e dizia respeito ao biénio 2015-2016. No verão de 2016, já com o novo Governo em funções, foi rubricada a Adenda 2016, no qual, entre outras questões, foi assegurada uma atualização de 1,3% com efeitos a janeiro. Também o novo protocolado terá retroativos a janeiro de 2017.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)

 

Data de introdução: 2017-02-09



















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